sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008



22 de fevereiro de 2008
N° 15518 - DAVID COIMBRA


Bom povo brasileiro

Fernando Collor é um homem alto. Um metro e oitenta e sete, informam os registros. Parece mais. Estive frente a frente com ele em 1989, quando disputou a eleição para presidente da República.

Antes da entrevista, estendeu-me uma mão do tamanho de uma tampa de panela de pressão e cumprimentou-me com energia assustadora.

Depois, no comício, falou com a veemência de um Mussolini e, terminado o discurso, cometeu algo assombroso: pulou do palanque para o chão da rua, caindo no meio da multidão.

Ficamos todos espantados com a temeridade. Todos: nós, jornalistas, os políticos locais, o povo que o via. Collor saiu marchando a passo largo, avançando sem vacilar, olhando fixamente para algum ponto à sua frente, decerto o porvir.

Caminhava dentro de uma jaqueta de couro preta, que, diziam, ocultava um colete à prova de balas. Caminhava espalhando o povo, que se abria à sua passagem como o Mar Vermelho aos hebreus de Moisés.

Ao ver a cena, concluí que Collor dificilmente perderia a eleição. O brasileiro por certo quereria aquele vigor a seu serviço.

É por isso que não considero a eleição de Collor um erro. Não votei nele, mas entendo quem votou - Collor dava, de fato, a impressão de ser um homem que podia resolver qualquer problema, de qualquer dimensão.

Agora, se a escolha de Collor tratou-se de compreensível equívoco do brasileiro, nas eleições seguintes o povo foi preciso e competente: só elegeu bons presidentes.

Fernando Henrique liderou a implantação do Plano Real durante o governo Itamar e, mais tarde, quando ele próprio se elegeu, soube corrigir o Plano e conduzi-lo ao sucesso com prudência e sabedoria. Assim, reelegeu-se.

Mas, se Fernando Henrique era ótimo presidente, não se podia dizer o mesmo de todos que o assistiam. Até porque realmente é impossível um homem, ainda que um bom homem, corrigir toda a estrutura torta que sustenta o poder em Brasília. Por isso, Lula se elegeu.

E Lula foi e é um bom presidente. O Brasil continua sendo dirigido com parcimônia, e é isso que o brasileiro quer: parcimônia. Segurança.

Eis o motivo para Lula ser contínua e progressivamente aprovado pelas pesquisas de opinião. O povo que o elegeu, e sabe por que o elegeu, entende que ele atendeu às expectativas.

Porque, ao contrário do que Pelé acreditava, o brasileiro sabe votar, vota bem e vota certo, vota em quem o representa de verdade. Muitos talvez não quisessem que Fernando Henrique e Lula fizessem o que fizeram, da forma como fizeram. A maioria, porém, queria.

Só que o entorno de Lula, como o de Fernando Henrique, não é confiável. Logo, Lula não vai eleger seu sucessor. O próximo presidente não será do PT, mas, isso é certo, será um bom presidente. O brasileiro sabe quem escolher.

O brasileiro sabe votar e o porto-alegrense é um cidadão de boa índole. Afinal, o que impede um porto-alegrense, qualquer porto-alegrense, de sair pelas ruas a atirar tijolos em vitrines e levar tudo o que lá está exposto, a dominar as Lus, as Patis, as Fês e as Caróis pelas tranças e arrastá-las para terrenos baldios e violá-las como animais, a arrancar as bolsas das velhinhas para lhes levar o dinheiro da pensão, a tomar as casquinhas de creme com canela das criancinhas?

O que os impede, alguém me diga, já que não se vê um policial em quilômetros e quilômetros das ruas da cidade? Povo bom!

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