sábado, 16 de fevereiro de 2008



17 de fevereiro de 2008
N° 15513 - David Coimbra


Sábado de manhã. Chovia, fazia frio

Já pensou alguém torcer pelo Próspera? O meu amigo Ricardo Fabris torcia pelo Próspera. Havia quem lhe perguntasse: por que é que alguém torce pelo Próspera? E o Ricardo começava a relacionar as glórias do clube.

Quais eram mesmo?... Bem, no Próspera jogava Laerte, o Urso, o melhor centroavante que vi dentro de um par de chuteiras. Nem Tostão, nem Romário, nem Reinaldo, nem Ronaldo com joelhos sãos: Laerte, o Urso.

Verdade que, como uma espécie de contrapeso, o Próspera tinha um japonês na ponta esquerda. Júlio César. Não que fosse ruim, mas sofria com o preconceito contra os japoneses no futebol.

Porque, naquele tempo, ninguém jamais vira um japonês jogando bola. Hoje até tem, sei lá, o Sandro Hirochi, mas nos anos 80 grassava uma crença de que japonês só fazia pastel, radinho de pilha e, mais recentemente, computador.

Então, Laerte, o Urso, na centroavância, Júlio César, o Japeta, na ponta esquerda, e, completando o ataque, Mica, um ponteiro-direito egresso aqui do Inter. Uma vez, um narrador foi suspenso da rádio por gritar:

- Mica: goooool!

Desde então era desse jeito que os torcedores o chamavam: Mica Gol.

O perigo dos cacófatos.

Outra glória do Próspera: o zagueiro central era Osires, que jogou no Cruzeiro.

Ah: em 1985, o Próspera terminou o Campeonato Catarinense na frente do Criciúma, e parece até que foi vice-campeão num ano aí.

Em resumo: não havia muitas glórias luzindo no cartel do Próspera. Mas sua torcida era fidelíssima e furibunda, composta pelos moradores do bairro... Próspera.

Tratava-se de um reduto dos mineiros de carvão de Criciúma, 45 mil homens acostumados às agruras das profundezas da terra, e, por isso mesmo, capazes dos maiores sacrifícios pelo seu clube, como incendiar carros de juizes pouco honestos, ou pouco sensatos, que marcavam pênaltis contra o Próspera.

O Próspera era bem como esse Jaciara que soube enfrentar o Grêmio, na quarta-feira, ou como o Nacional, da paraibana Patos, que terá o Inter pela frente, dia 27. O Jaciara, ninguém o conhecia, mas sua torcida estava lá, vibrante, gritando olé quando seu time trocava passes.

Por que tanto entusiasmo pelo Jaciara? O que um torcedor pode esperar do Jaciara? Mais importante: como é que uma criança decide se tornar torcedora do Jaciara, do Nacional da Paraíba ou do Próspera?

Um mistério. Mas isso é que é o arrebatador no futebol: o amor incondicional do torcedor, sobretudo do torcedor de time pequeno.

O Ricardo se esforçava por relacionar as glórias prosperanas, que glórias não havia. Ainda assim, lá estava ele, torcendo. Comovente. Torcer para Grêmio, Inter ou Flamengo é fácil.

São campeões de tudo. Torcer para o Próspera é uma prova de fidelidade, de amor e, mais: de amor desinteressado. Portanto, seja um torcedor de verdade: torça para um time ruim.

O Ricardo Fabris, uma manhã de sábado assisti a uma partida do Próspera com ele. Era inverno, fazia frio e chovia sem parar. Por algum motivo, o jogo fora marcado para as 10 da manhã.

Próspera e Chapecoense. O campo do Estádio Mário Balsini estava todo embarrado, cheio de buracos e poças d´água.

O Próspera já não tinha mais Laerte, o Urso, e nem o ponta Mica Gol. O placar, obviamente, ficou em zero a zero, sem que os jogadores dos dois times conseguissem criar uma única situação de gol, aplicar um drible e duvido que alguém tenha acertado um passe.

Torcedores? Contei quantos havia: 48. Alguns virados de costas para o campo, conversando, comendo bergamota ou amendoim.

Mas eu estava lá. Só que com razão: tinha de cobrir a partida pelo Diário Catarinense. O Ricardo, não. O Ricardo levantara-se numa manhã úmida e gelada de sábado e se acomodara na arquibancada de madeira do Estádio Mário Balsini apenas para ver o

Próspera e seu ponta-esquerda japonês. Isso que é dedicação! Isso é que é torcedor!

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