segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008



04 de fevereiro de 2008
N° 15500 - Kledir Ramil


Carnaval com Elis

No carnaval carioca de 2002, a Escola de Samba Caprichosos de Pilares resolveu prestar uma homenagem à cidade de Porto Alegre e desfilou com um enredo inspirado em Deu pra ti, a canção que fiz em parceria com Kleiton. Ficamos contentes e orgulhosos, pois essa é a maior manifestação de carinho que se pode receber no Rio de Janeiro.

Fomos convidados a desfilar como destaques do carro principal e aprendi até a dar uns passinhos pra não fazer feio na passarela do samba. Atravessar a Marquês de Sapucaí, um túnel de gente em alegria contagiante, foi inesquecível.

Estou acostumado a me apresentar em público - muitas vezes para multidões - e receber aplausos entusiasmados. É um dos privilégios da minha profissão. Mas nunca havia experimentado a sensação de tomar um passe coletivo em um corredor polonês do bem. Aquela força poderosa encheu minha alma de felicidade.

Ao final do desfile foi difícil descer do alto do carro alegórico. Não por dificuldades físicas, mas porque eu estava nas nuvens, levitando e não queria voltar à realidade. Lembrei do personagem de Marcelo Mastroianni em 8 ½ de Fellini, flutuando no céu com uma corda amarrada ao tornozelo.

Busquei uma palavra para definir aquele momento e acabei descobrindo o óbvio. Apoteose. O nome da praça está correto.

Até chegar ali, os meses de preparação incluíram visitas ao barracão da escola, escolha de figurino, ensaios na quadra, algumas tentativas de samba no pé e um pouco de aeróbica pra agüentar o esforço.

No fim, tudo não passa de 80 minutos, mas um sujeito sedentário como eu precisa ter um mínimo de preparo na musculatura das pernas para enfrentar uma aventura dessas.

Nos dias que antecederam o desfile, Kleiton e eu fomos bastante solicitados para entrevistas. No meio da função toda, ligou uma jornalista de um importante jornal de São Paulo. Queria saber como eu estava me sentindo, se já havia desfilado no Sambódromo, aquelas coisas. A conversa rolava normal até que ela comentou sobre as personalidades gaúchas que estariam presente e me perguntou:

- É verdade que a Elis Regina vai desfilar com vocês no carro alegórico?

Fiquei em silêncio para ver se era algum tipo de brincadeira, afinal Elis Regina havia morrido há 20 anos. Mas não, a jornalista falava sério. Pensei comigo "vou dizer o quê pra essa mulher?". Comecei a rir e respondi:

- Bem, acredito que de certa forma a Elis vai estar com a gente.

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