sexta-feira, 7 de dezembro de 2007



07 de dezembro de 2007
N° 15441 - DAVID COIMBRA


Homens de Esquerda

Minha faculdade foi financiada pelo governo federal. O velho e bom crédito educativo. Dezoito meses depois de formado, recebi pelo correio o gordo carnê que deveria pagar durante os anos seguintes, fui ao banco, saquei uma única cédula do bolso das calças Lee e ordenei ao caixa:

- Quita.

Uma só cédula foi o que custaram quatro anos de Famecos!

Antes disso, toda a minha educação foi forjada pelo ensino público. No Presidente Arthur da Costa e Silva, coleginho engastado nas profundezas do Parque Minuano, no bravo Instituto Piratini, nas bibliotecas do Estado.

Li todos os livros da Biblioteca Romano Reif, que hoje se ergue em tijolo exposto diante do Alim Pedro, campo sagrado onde dei muito lançamento de 60 metros, onde desarmei muito meia ciscador, onde refulgia como ponta-direita recuado.

Não fosse a educação pública, hoje eu seria, talvez, vendedor de churros. Ou de cachorro-quente, faço um cachorro-quente de su-ces-so.

Logo, por formação, não posso ser de Direita. Não posso ser um liberal, que é a favor da extinção do Estado. O Estado existe, justamente, para defender o mais fraco, para lhe propiciar, no mínimo, saúde, segurança e educação, como a mim propiciou.

A Direita, quando prega a extinção do Estado, alegando ser o Estado incompetente, está sendo cínica. A Direita sabe que incompetência não é justificativa para abolir uma instituição.

Caso contrário, a iniciativa privada seria muitas vezes abolida, no Brasil - não são raros os casos de incompetência da nossa classe empresarial. Sabe, a Direita, que não se implode um edifício porque o síndico é corrupto.

Então, entre Esquerda e Direita, sou Esquerda. Até porque a Esquerda é movida por uma idéia generosa de mundo. O comunismo e o socialismo acreditam no ser humano e na justiça. Podem não funcionar, podem ser inexeqüíveis, mas são pensamentos elevados, obviamente superiores ao pensamento da Direita, em termos humanísticos.

O problema é que a Esquerda, useira e vezeiramente, decepciona. Homens de esquerda, pretensamente cordatos, comportam-se como torcedores de futebol. Interessa-lhes mais a vitória da sua facção do que a justiça. Do que o Certo.

O caso de Chávez, na Venezuela. É um homem de Esquerda, faz um governo que parece beneficiar o mais fraco, isso tudo é verdade. Mas se trata de um óbvio, e grosseiro, aspirante a ditador.

Apresentou um projeto de mudança constitucional que não passa de uma cilada. Um plano que traz embutidos pontos importantes, como a redução da jornada de trabalho, quando sua real intenção é a eternização de Chávez no poder. Não fica bem defendê-lo.

Não a um homem que preza a justiça. Porque podem uns estar à esquerda e outros à direita, mas, acima de todos, está a democracia. Com um Estado eficiente, de preferência. Senão, com um Estado incompetente e corrupto. Mas sempre com democracia.

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