sábado, 1 de dezembro de 2007



02 de dezembro de 2007
N° 15436 - David Coimbra


No tempo das calças Topeka

Em 1967, a Loção Vitaminada Pantene fornecia "A proteção integral de seus cabelos". Sei disso porque vi num exemplar da revista Realidade daquele ano.

Tenho a coleção completa da Realidade, uma das mais importantes revistas do jornalismo brasileiro de todos os tempos, senão a mais. Pantene continha Pantyl, uma substância que tornava os cabelos saudáveis e os mantinha na cabeça.

Acho que não existe mais Pantene, o que explica o doping do Marcão e os cabelos cadentes do Leo Oliveira, aqui do Esporte da Zero. Desodorante Odorex também não há, hoje em dia - a Realidade de 1967 fazia muita propaganda de Odorex.

E duvido que alguma roupa do século 21 seja feita com Dralon, "uma fibra nobre, que não encolhe, não deforma, nem feltra". Legal, Dralon.

Uma revista ou um jornal antigos são o retrato mais exato do período em que circularam, mais do que textos de historiadores ou documentos de arquivos.

Porque na revista e no jornal estão a linguagem da época e as imagens de seus personagens, tudo de que se necessita para recuperar o passado.

Lá estão, nos meus velhos exemplares de Realidade, as calças Topeka, que tinham cintura baixa, corte justo e afunilado e zíper à vista; também a novíssima Remington Monarch Portátil-Profissional;

o Aero-Willys com seu motor de 110 HPs; o televisor Colorado RQ; o conhaque Dreher; o Gordini III com freio a disco; a Signal, única com listas vermelhas, onde fora colocado o hexaclorofeno, garantia de hálito puro; o Dulcora sabor chocolate e o sabor Butter Rum; o Calcigenol

Irradiado; os cigarros LS; e as calças Tergal, que pesavam 100 gramas por metro quadrado, o que não sei se é muito ou pouco, mas devia ser bom, ou não seria anunciado. Nada disso se encontra atualmente, nos shoppings centers da cidade.

Enfim. Tudo mudou, em 40 anos. Só duas realidades continuam as mesmas. Uma: a minissaia. As minissaias eram novidade, e eram minúsculas, em 1967. Agora, no verão de 2008, as minissaias encurtarão dramaticamente.

Sei disso, atento que sou ao mundo fashion. Durante os meses de calor, as mulheres pisarão com seus pezinhos 36 na Calçada da Fama dentro de minissaias do tamanho de cintos, mostrando suas panturrilhas, suas rótulas, suas coxas, até o alto, bem alto...

Outra realidade imutável: o Corinthians. Na edição de julho, meio amarelada sobre minha mesa do século 21, uma das reportagens principais leva o título "A isto se chama religião". Sobre o Corinthians e sua sôfrega torcida. A abertura do texto de Antônio Euclides Teixeira é a seguinte:

"Nas semanas em que o Corinthians ganha, a produção em São Paulo sobe 12,3%. Nas semanas em que o Corinthians perde, o número de acidentes do trabalho aumenta 15,3%.

O primeiro torcedor a invadir um campo de futebol foi um corintiano, no Pacaembu. Nesse mesmo estádio já morreram vários deles. Só em São Paulo existem mais de 200 clubes de várzea chamados Corinthians. O Corinthians é um time que consegue levar um cego ao campo de futebol.

É também o time que consegue fazer um padre mudar o nome de uma criança na hora do batizado. O Corinthians é um time que não ganha um campeonato faz mais de 12 anos - mesmo assim, é o único time que consegue lotar o estádio".

Isso em 1967. O Corinthians só conquistaria um título 10 anos depois, em 77, com aquele gol de Basílio na Ponte Preta. Nesse domingo de 2007, outro sete na vida do clube, o Corinthians pode cair para a segunda divisão.

Uma tal torcida não merece essa desdita, mas, se isso vier a acontecer, prevejo um futuro alvissareiro para o Corinthians. A tragédia, quase sempre, mobiliza mais do que a glória. A tragédia comove e arrebata.

Com um ano na segunda divisão, o Corinthians, que já é amado por tantos, se transformará no mais amado do Brasil. Não é o que um corintiano quer, bem sei. Mas, ora, é um consolo.

Nenhum comentário: