sábado, 5 de janeiro de 2013



05 de janeiro de 2013 | N° 17303
PAULO SANT’ANA | MOISÉS MENDES (interino)

O espinafre e a China

Tento entender o que se passa no mundo lendo o que meu amigo Luiz Antônio Araujo escreve em Zero Hora. Araujo é editor de Mundo e sabe quase tudo de tudo. Já transitou pela Política e pelo caderno de Cultura. Foi ele quem me alertou no ano passado, ao saber que eu comia tanto espinafre quanto os pandas comem bambus:

– Cuidado com o espinafre.

Fiquei sabendo que o espinafre não só não tem muito ferro, como eu achava que teria, como rouba do organismo a absorção do ferro fornecido por outros alimentos. O espinafre que deu aqueles braços ao Popeye seria na verdade uma esponja predadora. E só fiquei sabendo disso pelo Araujo, a enciclopédia da Redação.

Araujo é um tipo raro. Um cara que mergulha na reacomodação de forças entre sunitas e xiitas, no poderio infindável de um Putin e no drama dos chavistas é o mesmo que, com singeleza, como quem não quer nada, um dia te informa sobre a outra face do espinafre. Fui ao Google para conferir: está lá, o espinafre não é o que parece.

Agora mesmo gostaria de entender o que se passa na China e, se possível, o que vai acontecer por lá. Araujo não é vidente, mas sabe do que falo. A China tem mais máscaras do que o espinafre. Como pode um regime montado num monolito dito comunista conviver com tantas faces? Ou essa é a própria lógica do regime?

Ontem mesmo, li que o governo chinês recrudesceu o controle da produção de informação das vozes discordantes, principalmente na internet. Sabe-se que os chineses prosperam inspirados no que existe de pior do pior dos capitalismos, porque o regime assim determina, sem chance para contestações.

O que eu sei também e o que você sabe é que a China produz tudo o que consumimos aqui, da chaleira aos automóveis, sob um sistema de trabalho primitivo. O que eu queria saber do Araujo é o que ele acha desses empresários do mundo ocidental – alguns bem próximos de nós – que se valem dessa aberração para produzir na China o que poderiam fazer aqui. Aproveitam oportunidades, onde estiverem? O lucro é amoral?

Andei lendo que em algum momento os diques irão se romper na Rússia, na China e em outros lugares onde a democracia lateja, como latejou no mundo árabe. Será? (Araujo foi um dos jornalistas que tomaram socos e pontapés no Egito dos que tentavam evitar a queda do regime, quase dois anos atrás.).

Também continuo lendo que as economias de países gigantescos como esses dois só funcionam com a mão forte e centralizadora do Estado. Sem isso, não haveria um “capitalismo” russo. Penso nisso e até hoje me lembro da cena daquele chinês que toreou um tanque que se dirigia à Praça da Paz Celestial, em 1989.

O homem sumiu, mas o mundo e os tanques não param. Daqui a pouco estaremos tomando água mineral com bolinhas chinesas. E iremos vivendo nossas ilusões, acomodadas aos nossos interesses, complacentes com os comunistas que nos servem, assim como eu vivi tanto tempo com o engano de que o espinafre me ajudava.

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