terça-feira, 5 de maio de 2015


05 de maio de 2015 | N° 18153
DAVID COIMBRA

Elis Regina poderia ter sido presa

Estava ouvindo o João Bosco. As músicas dele em parceria com o Aldir Blanc têm uma brasilidade que está em extinção. Ninguém mais escreveria, hoje em dia:

“Genésio, a mulher do vizinho sustenta aquele vagabundo.”

“E o meu café, cadê? Não tem, vai pão com pão.”

“Costurou na boca do sapo um resto de angu, a sobra do prato que o pato deixou.”

E tem aquela da mulher que vive para atazanar o marido e, numa manhã, depois de sonhar à noite com ele, mandou que jogasse no burro. Ele jogou e acertou no milhar.

Uma das mais lindas, que era cantada também por Elis Regina, hoje seria impossível. É Gol Anulado. A letra diz assim:

“Quando você gritou Mengo!

No segundo gol do Zico

Tirei sem pensar o cinto

E bati até cansar.

Três anos vivendo juntos

E eu sempre disse contente:

Minha preta é uma rainha

Porque não teme o batente

Se garante na cozinha

E ainda é Vasco doente.”

Uma história com sabor de aipim frito na manteiga. Durante três anos, a ilustríssima dizia para ele que era vascaína, mas, quando Zico meteu o segundo gol num Flamengo e Vasco, ela não se aguentou e extravasou sua paixão rubro-negra. Não duvido que o vascaíno da música preferisse ser traído por outro homem do que por outro time.

Essa poesia hoje causaria indignação, revolta e, não duvido, processo. As redes sociais se ergueriam em fúria, apontando João Bosco, Aldir Blanc e Elis Regina como incentivadores da violência contra a mulher. O Ministério Público puxaria da bainha a espada da Justiça. Depoimentos comoventes de mulheres espancadas seriam espalhados pelo Whats, fazendo muita gente chorar e balbuciar, com a voz embargada:

– Essa é a nossa luta, e a nossa luta não é engraçada...

De fato, luta-se muito, Brasil afora, e lutas não são engraçadas. Que fazer? Não há outro jeito, a não ser rir menos.

É fácil ser campeão

Aldir Blanc é vascaíno, como o personagem da música. O Vasco foi campeão com um gol de Gilberto, centroavante que jogou no Inter há pouco. O Atlético de Minas foi campeão com gol de coxa de Jô, centroavante que jogou no Inter há pouco. E o Inter foi campeão com gol de Nilmar, centroavante que também jogou no Inter há pouco.

Aí está uma pista forte das razões do bom sucesso do Inter nos últimos anos. Um time, para vencer, tem que ter quem marque gol. O Inter, quando compra caro, compra goleador. É simples. Nilmar se pagou com um único gol e 45 minutos de bom jogo.

E não adianta ser centroavante. Braian Rodríguez é centroavante e marcou 40 gols em 10 anos, média de quatro por temporada. Até Rogério Ceni fez mais.


Você quer saber se um time é bom? Verifique quantos são os jogadores afeitos a fazer gol que estão em campo. Lembra do Grêmio dos anos 1990? Só Roger e Danrlei não faziam gol. O Inter dos anos 1970? Só Vacaria não fazia gol. Não tem mistério: na frente, você bota os bons, atrás, organiza.

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