sexta-feira, 22 de maio de 2015


22 de maio de 2015 | N° 18170
DAVID COIMBRA

Pior é a malícia

Adeputada Manuela promoveu um debate sobre o ódio na internet, e o debate acabou por causa do ódio. Aconteceu na quarta passada, isso, na Assembleia Legislativa. A plateia brigou, e o debate acabou.

Não deixa de ser divertido.

As pessoas se preocupam com o ódio na internet. Eu não. Às vezes, quando um leitor envia um comentário odioso sobre mim, faço questão de publicar e ressaltar, para deixar que os outros leitores respondam.

O ódio na internet é fácil de ser manipulado, exatamente por ser ódio. É um extremo, e a maioria das pessoas não está nos extremos. A maioria das pessoas está no meio.

O problema da internet não é o ódio; é a malícia. É o trabalho subjacente e sujo de decomposição de reputações. E se trata de trabalho mesmo. É atividade remunerada.

Malícia a soldo.

Já ocorreu muito disso, no Brasil, mas nunca de forma tão intensa e solerte como na última campanha eleitoral, contra Marina Silva.

Cubro política desde os anos 1980. Entrevistei alguns dos maiores personagens políticos do Brasil, como Lula, Dilma, Brizola, Maluf, Ulysses, Covas, Collor, Prestes e muitos, muitos outros. Pois afirmo que nenhum dos que encontrei tem a dimensão humana de Marina Silva.

Nenhum.

É certo que há equívocos no projeto político de Marina, é certo que não concordo com ela em vários pontos, mas também é certo que ela é uma boa pessoa.

Uma boa pessoa. Não há nada melhor que possa dizer de alguém.

Na campanha eleitoral, parecia, em dado momento, que Marina ganharia no primeiro turno. Eduardo Campos morrera naquele acidente aéreo e Marina assumiu a candidatura a presidente em seu lugar. A maioria dos brasileiros não queria votar no PT nem no PSDB. A maioria só vota nesses, como votou, por falta de opção. Marina, naquele momento, ofereceu a opção. A morte meio que beatificou Campos, e essa aura passou para sua sucessora. Marina surgiu como a esperança, e voou nos índices das pesquisas eleitorais.

Então, foi desencadeada uma campanha chamada de “desconstrução” da imagem da Marina. Essa campanha não foi assumida de forma institucional pelo PT, mas foi promovida de forma sub-reptícia pelos petistas. Eles intumesceram as redes sociais com insinuações e ilações venenosas sobre Marina, não raro com mentiras desavergonhadas.

Uma das “acusações” era de que Marina é ligada a Neca Setubal, herdeira do banco Itaú. Marina respondia que Neca é apenas uma educadora, mas os maliciosos da internet se riam e diziam que ela ia entregar a economia para o Itaú. Viu-se, depois, que era caso de concorrência entre bancos: Dilma, reeleita, entregou a economia a Levy, do Bradesco.

Outra acusação era de que Marina é evangélica. Vendo a atuação dos intelectuais do governo, digo que prefiro mil vezes um crente sincero a um ateu cínico na condução dos negócios públicos.

Mas o fato é que, em menos de três meses, a imagem de Marina, uma das mulheres mais dignas e doces da história da política brasileira, não foi desconstruída: foi destruída. E ela foi só uma, entre tantos.


Hoje, os governistas reclamam do ódio na internet. Os governistas têm razão. Os brasileiros aprenderam a odiar.

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