17
de maio de 2015 | N° 18165
MARTHA
MEDEIROS
O segundo encontro
Afinal, um encontro não é uma boa notícia?
O
segundo, ela me respondeu.
Ela
estava sentada bem na minha frente, abalada, desanimada, com péssimos
presságios em relação ao que aconteceria dali a duas horas: ela teria o
primeiro encontro com um homem de quem estava muito a fim. Me explica, pedi. Me
explica por que você não está soltando foguete. Me explica o motivo para não
estar no cabeleireiro. Me explica a parte que eu perdi: afinal, um encontro não
é uma boa notícia?
O
segundo, ela me respondeu. O segundo encontro me faz soltar rojão. O primeiro é
ir para o sacrifício.
Diante
do meu espanto, ela resolveu reavivar minha memória.
Primeiro
encontro, disse ela, é que nem entrevista de emprego. O nível de stress é o
mesmo. Você não pode ir produzida demais, para que ele não pense que você está
desesperada, nem ir vestida de qualquer jeito, para ele não pensar que você
está pouco se lixando. Você não pode ser muito engraçada, para não passar a
impressão de frivolidade, nem séria demais, para ele não te considerar uma
chata.
Você
não pode falar dos seus ex-amores, para ele não ficar inseguro, mas se não
mencionar nenhum ele vai pensar que você é uma laranja podre que ninguém quis
catar do chão. Você não deve beber demais, pois seria deselegante, mas pedir um
suco vai fazê-lo pensar que você tem 14 anos.
Você
passa a noite falando sobre tudo de que gosta – filmes, cidades, programas de
tevê, esportes, música – e precisa se controlar para não pedi-lo em casamento
quando ele concordar com suas preferências, ou se controlar para não cair em
prantos quando ele disser que os Rolling Stones são detestáveis e que não
suporta rock, mas que morreria por um show ao vivo do Lionel Richie.
Ela
continua: “Aí você lembra que o Lionel Richie bem que se esforçou, compôs We
Are the World com o Michael Jackson e você quase gostou daquela música que ele
fez para o filme O Sol da Meia-Noite, e percebe que já está fazendo concessões
antes mesmo de seu pretendente pedir a conta, e ia esquecendo esta parte, a
conta: se você se oferece para dividir, ele pode te achar bacana, mas também
pode desconfiar de que você seja uma feminista que nem ao menos se depila.
E se
você não se oferece para pagar ele pode te achar uma folgada ou, ao contrário,
te considerar uma fêmea que reconhece seu papel no jogo, uma mulher acostumada
a sair com cavalheiros – como saber?”.
Apavorada
com o quadro esquizoide que ela me apresentava, arrisquei: nenhuma
possibilidade de ser você mesma, criatura?
“Claro
que existe a possibilidade de ser eu mesma. No segun...”
Não,
não: nenhuma possibilidade de ser você mesma no primeiro encontro?
“Zero”.
E assim, convicta, preparou-se para a ida ao sacrifício. Retirou seu Crocs e
pediu minha sandália emprestada.
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