terça-feira, 8 de fevereiro de 2011



08 de fevereiro de 2011 | N° 16605
J.A. PINHEIRO MACHADO - Interino


Abraços e beijos da Dona Emaíl

Nos primórdios da irresistível era digital, o desembargador federal Flavio Rostirola foi surpreendido pelo recado da secretária: “O presidente vai lhe mandar uma mensagem pela dona Emaíl”. Não era uma ironia.

Foi preciso explicar o que era um e-mail. Hoje, a “dona Emaíl” é a senhora do destino de quase todos nós. Estão acabando as cartas, bilhetes e cartões com mensagens. As seções de cartas de ZH e de todos os jornais e revistas do mundo foram dominadas pelos e-mails.

Numa época de muitos afazeres, lentos deslocamentos no trânsito saturado (em breve os engarrafamentos chegarão a Arroio Teixeira!), pouco tempo para o convívio, a rapidez do e-mail salva empregos, amizades e casamentos. “Mandei um longo e-mail para minha mulher: não falo com ela há dois dias!” – confessou um amigo, dias atrás. A confissão veio num e-mail que, em vez de “abraços”, tinha “abçs”. E, com certeza, o e-mail em que ele renovou sua paixão terminava com “bjs”.

Mas, quase sempre, a síntese é expressão do talento. Cid Pinheiro Cabral, antigo colunista de Zero Hora e da extinta Folha da Tarde, me deu a lição definitiva, quase 40 anos atrás. Jovem repórter da Folha, escrevi um texto de 60 linhas que, na hora do fechamento do jornal, precisava ficar em 15 linhas. “Não há como reduzir a matéria”, protestei, tentando salvar minha obra-prima, diante do impassível chefe da oficina do jornal.

O mestre Cid, primo-irmão do meu pai, decidiu ajudar o parente. Leu o texto e reescreveu-o em poucos minutos. Para minha perplexidade, não precisou nem das 15 linhas: as 60 linhas originais ficaram em 13, numa síntese elegante e consistente, com todas as informações.

O desafio do Twitter parecia intransponível: um máximo de 140 toques por mensagem. Rapidamente, no entanto, transformou-se num prático meio de divulgação, de grande eficácia e abrangência, com milhões de seguidores. Em 140 toques, modelos & atrizes, atletas, políticos, celebridades e muitos de nós outros anunciamos nossos feitos e defeitos.

Certa vez, numa apresentação na aula de literatura, no colégio, me atrapalhei com redundâncias, e gaguejei um pedido de desculpas: “Me faltam palavras...”. O professor sorriu implacável: “Não. Não faltam palavras. Faltam ideias”.Só com boas ou más ideias é possível produzir um texto conciso, usando um mínimo de palavras e um máximo de precisão.

É bem conhecida a máxima de Pulitzer que exigia três virtudes de um redator: “Precisão, precisão e precisão”. Por certo que a virtude da concisão não é tarefa rápida. E o Padre Antonio Vieira sabia disso quando redigiu um longo relato ao rei de Portugal, e encerrou a missiva com o famoso pedido de desculpas: “Majestade, perdoe se fui longo. É que não tive tempo de ser breve”.

Entretanto, a gentileza agradeceria, e a concisão não se ofenderia, se a dona Emaíl mandasse seus “abçs” e “bjs” cordialmente por extenso.

Moacyr Scliar, dono deste espaço nas terças-feiras, encontra-se hopitalizado

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