quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011


Túlio Martins*

10 de fevereiro de 2011
N° 16607 - ARTIGOS


À espera da próxima vítima

Alguns crimes causam uma profunda sensação de mal-estar na comunidade. São fatos que, além de toda a brutalidade do ato violento e contrário à lei, trazem dentro de si componentes de aberração e de loucura que se expandiram para além dos limites da vida do indivíduo.

Assim são os chamados crimes passionais – de ódio ou de paixão –, em que o agente mata o objeto de seu amor doentio e igualmente agride a sociedade por levar a um resultado trágico o final de um relacionamento.

O exemplo mais comum é o homem que mata a mulher com a qual tem algum vínculo de afeto, mas também encontramos mulheres que matam homens, além de toda sorte de violências contra colegas de trabalho, amantes, filhos, pais e amigos.

O estudo do comportamento humano mostra que há momentos em que o único prazer possível é o alívio do sofrimento causado por traumas e frustrações não resolvidas. A maior parte dos indivíduos consegue superar tais conflitos através de mecanismos socialmente aceitáveis; outros, possuidores de egos frágeis e mal formados, se transformam em perseguidores criminosos.

A conduta passional é a conclusão de um processo patológico em que uma emoção crônica, focada em uma pessoa, supera as contenções (educação, família, autoridade) que a mantinham em limiar tolerável.

Nesses casos, a doença emocional do criminoso – e muitas vezes, em menor grau, também da vítima – leva a uma fantasia de dependência e simbiose entre duas vidas. O sujeito passa a acreditar que não poderá viver sem o outro e que a perda do afeto será sua própria destruição. Frases como “minha vida é tua vida” e “não posso existir sem o teu amor” são a mais absoluta verdade na mente do assassino.

Tão intenso é o ódio – e consequentemente os sentimentos de derrota e destruição –, que são frequentes os crimes passionais em que após matar o objeto de seu amor o criminoso pratica o suicídio; contudo, é raríssimo encontrarmos um caso em que esse cometa uma violência contra um transeunte ou um policial. O foco único de sua cólera é aquele que foi eleito como destinatário da paixão mórbida.

O protagonista do crime passional acredita em suas próprias fantasias e leva a sério as mais delirantes hipóteses de desamor, perda e traição; após o crime, não nega os fatos, não se arrepende, não pede desculpas e não se lastima. Apenas aguarda, na marcha inexorável do tempo, que surja outra vítima crédula e incauta.

*Desembargador

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