sábado, 19 de fevereiro de 2011



19 de fevereiro de 2011 | N° 16616
NILSON SOUZA


O gordo vencedor

Ronaldo fez o Brasil inteiro chorar com ele ao se despedir de uma carreira esportiva tão brilhante quanto acidentada. Poucos atletas no futebol viveram de forma tão intensa a glória e a desgraça. Ele foi campeão mundial pela primeira vez aos 17 anos – sem ter tocado na bola, é verdade –, e oito anos depois conquistou novamente o título mais importante do principal esporte do planeta, desta vez com todos os méritos.

Fez bem mais: tornou-se o maior artilheiro em Mundiais e foi três vezes reconhecido pela Fifa como melhor do mundo. Também teve uma trajetória internacional extraordinária, nos clubes mais badalados da Europa e participando pelos dois lados das maiores rivalidades da Espanha e da Itália.

Seu currículo é incomparável.

Suas dores também. Operou o joelho quando atuava pelo PSV, teve uma convulsão na Copa da França, rompeu o tendão patelar na Inter de Milão, teve problemas musculares no Real Madrid, estourou o outro joelho com a camisa do Milan e passou a ter lesões sucessivas até o fim de sua carreira, no Corinthians. Mas sempre deu a volta por cima. Caiu e levantou tantas vezes, que fez jus ao apelido de Fenômeno. Só não conseguiu superar um adversário inflexível e, às vezes, indriblável: a balança.

Tornou-se um gordo. Talvez por efeito dos anabolizantes receitados pelos clubes europeus para dar-lhe massa muscular, talvez pelo distúrbio de tireoide revelado em tom de habeas corpus na entrevista derradeira como atleta, provavelmente pela conjugação das duas coisas e também por um certo descuido com o preparo físico, o fato é que se tornou um gordo. E os gordos, como todos sabemos, sofrem restrições de todo tipo, ainda mais no futebol.

O gordinho da pelada de rua, no máximo, vai para o gol. O gordo da turma carrega todos os apelidos e vira protagonista de anedotas e brincadeiras nem sempre delicadas. O gordo da tropa fica para trás e paga apoio na frente dos outros. O gordo anônimo é referência na arquibancada. E a gordinha da festa nem sempre acha par para dançar.

Apesar dos padrões de beleza atuais, na maioria das sociedades, privilegiarem os magros, os gordos podem ser muito felizes, sim, se tiverem saúde e boa cabeça, principalmente para encarar preconceito e incompreensão. O importante é que se sintam bem consigo mesmos e que, como Ronaldo, saibam erguer-se ainda mais fortes das inevitáveis quedas da existência humana.

Uma daquelas lágrimas do craque, tenho certeza, foi um desagravo a todos os gordos discriminados pela vida.

Gostoso sábado para você e um lindo fim de semana.

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