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sábado, 7 de junho de 2008
07 de junho de 2008
N° 15625 - Nilson Souza
Olhando para as estrelas
Meu repórter interno acordou quando aquela doce senhora começou a contar sua vida de oito décadas. Então ela me disse que veio quase menina do interior do Estado para cursar Educação Física na Capital. Interrompi, curioso:
- A senhora praticava algum esporte?
Ela exprimiu uma negativa sorridente, seus olhos claros adquiriam um brilho ainda mais intenso e sussurrou como se fosse uma confissão:
- Eu queria ser bailarina. Adorava dançar.
Aquele olhar brilhante me voltou à memória esta semana, quando assisti a uma fulminante reportagem de televisão. Mostrava um grupo de bailarinas cegas apresentando-se diante de artistas norte-americanos que vieram fazer um show em nosso país. Questionada pela repórter, uma menininha de seis ou sete anos explicou com era fácil dançar:
- A gente só tem que andar na ponta dos pés e olhar para as estrelas.
A menina é uma das alunas da Associação de Ballet e Artes para Cegos Fernanda Bianchini, de São Paulo, que oferece aulas gratuitas de balé clássico, sapateado, dança de salão, capoeira, danças folclóricas e teatro para jovens carentes, todas deficientes visuais. A professora, que é bailarina e terapeuta, inventou um método de ensino pelo toque.
Parecia impossível que alguém aprendesse a dançar sem ver um movimento semelhante. Mas o que é impossível para quem está determinado a superar limites e limitações? A mestra conta que o aprendizado foi dela:
- No início, não foi fácil, mas a força de vontade em aprender algo novo foi tão grande, que eu nunca tive que ensinar duas vezes o mesmo passo, pois as alunas jamais esqueciam.
Na reportagem a que assisti, os norte-americanos foram às lágrimas - e os telespectadores também - quando uma das garotas acompanhou com as mãos o movimento de um bailarino profissional e logo em seguida executou a mesma coreografia, sem erros.
Processava-se, naquele instante mágico, o milagre da dança, desta fusão perfeita entre o corpo e a alma, que fez a velha senhora voltar ao seu tempo de menina quando recordou o seu sonho nunca realizado.
Que estranho poder tem a dança! Como mexe com os sentimentos e com a imaginação!
Foi uma outra jovem cega, com palavras simples, que legendou aquele instante especial da transformação do toque em ritmo:
- O importante é sentir. Ver, a gente imagina.
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