sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008



UM NOBEL PARA MIM

A Vai-Vai foi campeã em São Paulo falando de educação no Brasil.

Aqui, nesta coluna, os e-mails sobre as cotas vem-vem sem parar. Há de tudo. Um sujeito me chama de louco, outro de gênio.

Uma senhora gostaria que eu recebesse o Nobel pelos meus textos. Essa é uma idéia que me parece bastante louvável. Há correções e contribuições. O coronel Leonardo Araújo, do Colégio Militar, me corrige com elegância: sua instituição está longe de ser uma escola de brancos ricos.

Outro leitor garante que jamais um negro foi barrado numa universidade pública por ser negro, pois isso é ilegal. Estão todos certos. Pode-se também dizer o contrário: milhões de negros são barrados a cada ano.

O aspecto formalista do princípio legal não basta. O paradoxo é que o formal acaba por encobrir a discriminação que deveria evitar.

Um leitor alertou-me para um detalhe interessante: o sorteio para preencher as vagas nas universidades públicas nada resolveria, pois a maioria dos negros não consegue terminar o ensino médio.

Outro me faz uma pergunta curiosa: por que os mais ricos não dominam também as escolas públicas de ensino fundamental e médio como fazem com as universidades?

A sua explicação, mesmo óbvia, é instigante: porque nesses níveis o poder público deve garantir vagas, o que faz o sistema, com parcos recursos, inchar e perder qualidade.

Se, por exemplo, o acesso a todo o ensino médio público e gratuito se desse por seleção (mérito), para um número de vagas pré-fixadas, boa parte dos mais ricos deixaria as escolas privadas. No Brasil é simples: ensino de boa qualidade para poucos ou de má qualidade para todos.

O país não pode crescer primeiro para educar os seus jovens depois. É o contrário. Um leitor destaca este paradoxo: se os mais ricos saíssem das universidades públicas, elas ficariam tão abandonadas como boa parte das escolas públicas dos níveis fundamental e médio.

Somos reféns dos mais ricos para que haja universidade pública qualificada. Ou eles estudam nelas de graça ou o investimento desaparece.

O ex-secretário estadual de Educação, José Fortunati, a quem só posso criticar por ser gremista, mandou-me uma mensagem clara: 'Tens toda a razão ao afirmar que ‘só pode haver decisão de mérito quando há igualdade de condições na preparação para a disputa’.

É fácil de se perceber que um estudante que pertence a uma família de classe média alta apresenta no seu cotidiano algumas vantagens comparativas muito superiores aos dos seus colegas de famílias de baixa renda.

Um estudante de classe média vai até a escola com uma boa alimentação e, certamente, teve todas as condições para usufruir de um bom sono profundo e reparador, o que nem sempre existe para alguém que mora num barraco ou em algo parecido. Defender que o exame vestibular seleciona os ‘melhores’ é uma hipocrisia absoluta.

O vestibular seleciona, na imensa maioria dos casos, os que tiveram as melhores condições para se preparar para as provas. E, nem sempre, são os ‘melhores’ que têm acesso à universidade pública e gratuita'.

Como se vê, não estou sozinho neste baile. Em lugar de destruir a Amazônia como forma de impressionar o mundo, poderíamos fazer uma revolução na educação.

Só que isso teria um inconveniente: o risco de se ter uma população mais crítica e exigente a ponto de renovar brutalmente o Congresso Nacional. Melhor deixar assim mesmo. O que seria de nós sem os senadores sem voto?

juremir@correiodopovo.com.br

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