sábado, 1 de dezembro de 2007



01 de dezembro de 2007
N° 15435 - Ricardo Silvestrin


Fazendo a mala

Voltando de carro da Serra, o céu estava dando um show. Algumas pequenas nuvens carregando o tom rosa do final de tarde pelo azul enorme.

Estamos em dezembro. E melhor ainda que olhar o céu sem finalidade nenhuma, é olhar para ele nos intervalos de leitura de um livro de poesia. Digo isso tudo porque começo a me imaginar nas férias que vêm aí. Já estou fazendo o meu estoque de leitura.

Dois livros que venho lendo e não vejo a hora de colocá-los na mala são o Obra Poética, que reúne toda a poesia do argentino Jorge Luis Borges, e Inventario Tres, com a produção de poemas de 1995 a 2001 do uruguaio Mario Benedetti. Os dois em espanhol. Vou lendo sem me preocupar com o que não entendo. Comprei um dicionário, mas nunca abri.

Borges é um dos mais inventivos escritores do século 20. Entre nós, é muito mais conhecido pelos seus contos. Já em Buenos Aires, perguntando para as pessoas que poetas argentinos me recomendavam, Borges sempre estava na lista.

Benedetti vive em Montevidéu. Está com 87 anos. Continua produzindo em alto estilo. Seu livro mais recente, de 2006, Canciones del que No Canta, é excelente. Ele também escreve prosa, mas, ao contrário de Borges, é mais conhecido como poeta.

Nos dois volumes deles que não vejo a hora de levar para a praia, a poesia é inteligente, com uma densidade humana, uma competência comunicativa. E, sobretudo, com uma força e uma dramaticidade típicas do temperamento de origem espanhola.

Quando fiz um recital dos meus poemas em Buenos Aires, antes de mim falaram seus textos os poetas de lá. Ao final, um dos argentinos da platéia veio me perguntar a que eu atribuía a diferença de clima entre a minha poesia e a deles.

Chamou a atenção o contraste entre o drama dos hermanos e o gingado do meu texto. Falei que talvez fosse a diferença entre o tango e o samba. Mas o Benedetti, uruguaio, também tem grandes momentos de bom humor nos seus poemas. E tanto ele como Borges trazem, nesses dois livros, haicais.

Borges apresenta a seqüência que chamou de Diecisiete Haiku. Haiku é como se chama haicai no resto do mundo. Millôr Fernandes brinca que o nome haiku não pegou aqui pela sua última sílaba. Benedetti vem com o Rincón de Haikus, de 1999, nada menos do que 224 haicais.

Agora, três do Borges: (1) "Callan las cuerdas. / La música sabía / lo que yo siento."; (2)"El hombre ha muerto. / La barba no lo sabe. / Crecen las uñas."; (3)"La vieja mano / sigue trazando versos / para el olvido.".

E três do Benedetti: (1)"en el amor / es virtuoso ser fiel / mas no fanático"; (2)"no más rodeos / prefiere que la besen / a quemarropa"; (3)"sé que el abismo / tiene su seducción / yo ni me acerco". Precisou de dicionário?

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