quarta-feira, 19 de março de 2025


19 de Março de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Tática Robin Hood pode esbarrar no xerife

Promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - e de seu adversário de campanha, é bom lembrar -, a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil ao mês teve cálculo de custo tributário (renúncia fiscal) reduzido de R$ 32 bilhões para R$ 27 bilhões na véspera do anúncio.

O projeto prevê uma "escadinha" que vai tributar com mais suavidade quem ganha até R$ 6,5 mil, para não criar novas distorções. Na melhor das hipóteses, começa a vigorar em 2026, não por acaso ano eleitoral. Só que, para aprovar a proposta apresentada ontem - com a presença de representantes do Congresso - será preciso compensar a perda.

O formato é conhecido: serão taxadas rendas mensais superiores a R$ 50 mil que hoje não pagam IR ou recolhem um percentual insignificante, como detalhou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

A proposta tem mérito e amparo nas melhores práticas tributárias: desde Robin Hood, a razão está com quem cobra mais de quem ganha mais e menos de quem ganha menos. Não é o que ocorre, como regra, no sistema tributário brasileiro, um dos mais regressivos do planeta.

Em tese, qualquer benefício tributário tem tramitação fácil no Congresso. Ou seja, aprovar a isenção vai ser fácil. Complicado será garantir a compensação, que atingirá um público com forte representação parlamentar e acesso aos representantes. Ou seja, o problema vai ser o xerife de Nottingham, que simboliza a força da injustiça tributária.

Cálculos que se refletem nas urnas

Conforme as contas do governo, trata-se de tributar 141 mil pessoas para aliviar 10 milhões de contribuintes. Em versão parlamentar - e governamental, dada a perspectiva de reeleição -, equivaleria a correr risco de perder 141 mil votos para ganhar 10 milhões. Mas é preciso levar em conta que nem só com votos se constrói uma eleição.

Quem ganha menos de R$ 50 mil, mesmo pagando menos do que quem ganha R$ 7 mil, não será afetado. Acima, haverá alíquotas graduais, que vão de 2,5% a 10%. Só quem ganha R$ 100 mil mensais e é isento ou subtributado (paga menos do que a média) vai encarar o desconto máximo de 10%. Considerando que o IR na fonte para assalariados que recebem a partir de R$ 7 mil seguirá em 27,5%, é o que pode ser descrito como um baita negócio, palatável até para o xerife. Quem ganha mais seguirá pagando proporcionalmente menos. Mas em Nottingham tudo é possível. _

E para quem ganha até R$ 7 mil?

Ao leitores que pediram para a coluna "desenhar" como quem ganha até R$ 7 mil será beneficiado pela isenção para quem ganha até R$ 5 mil, más notícias: não será. O detalhamento da Receita Federal só contempla rendas de até R$ 6,5 mil com a "escadinha" projetada a partir do abatimento de 100% para quem ganhará até R$ 5 mil no próximo ano. Na tabela, fica claro: se o projeto for aprovado, quem ganhar R$ 7 mil em 2026 (é preciso lembrar de projetar eventuais correções de salário ou outras rendas) terá benefício zero.

Por que agora o mercado reagiu bem à isenção para até R$ 5 mil

Há três meses e 20 dias, a inclusão da proposta de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil junto com medidas de corte de gastos fez o dólar quebrar sucessivos recordes nominais até atingir R$ 6 pela primeira vez. Ontem, após Lula assinar o projeto, o dólar desceu para um patamar abaixo de antes desse grande ruído. Fechou em R$ 5,672, resultado de oscilação para baixo de 0,25%.

O que explica essa grande mudança? Em primeiro lugar, foi retirado o fator surpresa. Em novembro passado, o que o mercado e especialistas em contas públicas esperavam era um corte de gastos capaz de sinalizar que a dívida pública do Brasil não sairia dos trilhos. Veio um pacote tímido e uma renúncia fiscal na época estimada em R$ 35 bilhões. Além de reduzir despesas de forma significativa, seria preciso cobrir um novo rombo.

Depois, o governo apresentou números e detalhes, reforçando a tese de que a isenção só será aprovada com a devida compensação. Não é favor nem mérito, é lei, mas sempre há temor de alguma "flexibilidade". Embora ainda existam dúvidas, a reação foi bem melhor.

No lado das contas públicas, a Instituição Fiscal Independente (IFI) considerou a mudança "positiva", por focar "na correção parcial das iniquidades sociais produzidas por nosso sistema tributário onde os pobres pagam proporcionalmente mais impostos do que os mais ricos".

Felipe Salto, economista-chefe da Warren, disse que a proposta tem "mecânica bem-construída". Observou que ainda há incertezas, como o que pode ser alterado no Congresso, e o possível efeito inflacionário da medida, que beneficia um grupo com "propensão ao consumo".

Outro alívio veio com o detalhamento do imposto mínimo de 10%, que não será adicional. Salto explicou que se alguém que tem renda mensal de R$ 100 mil, portanto sujeito à alíquota de 10% do imposto mínimo, já estiver pagando 9,2%, só terá de recolher 0,8 ponto percentual a mais.

O mesmo vai ocorrer ao longo da "escadinha" que prevê alíquotas graduais, de 2,5%, 5% e 10%. No "andar de cima", onde fica o mercado financeiro, foi um alívio. Nesse ponto, também há dúvidas, mas o fato de não ser adicional já ajuda. _

Tramontina terá produção fora do Brasil

É de uma joint venture - acordo para unir empresas para uma tarefa específica - que nasce a primeira fábrica da Tramontina fora do Brasil. A parceria vai permitir a operação de uma unidade, chamada Aequs Cookware Products Limited (ACPL), nas instalações da Aequs em Hubballi, centro-sul da Índia.

Fruto de investimento de cerca de R$ 52 milhões, a unidade tem 80 funcionários e capacidade de produção de 400 mil panelas de alumínio por mês, com revestimento antiaderente ou cerâmico. A partir de outubro, deve começar a fabricação de panelas de aço inoxidável, com capacidade para 75 mil unidades mensais.

Em formato que permite que as duas empresas dividam os investimentos e os ganhos, o acordo reforça a intenção de expansão da Tramontina na Ásia. A marca já havia instalado, em junho, um centro de distribuição em Mumbai, na Índia.

- Vemos grandes oportunidades de crescimento, tanto na capacidade de produção quanto na gama de produtos - afirma o presidente do conselho de administração da Tramontina, Eduardo Scomazzon. _

A operação de R$ 24 milhões que uniu duas empresas gaúchas

Depois de fazer 42 operações e alavancar R$ 2,5 bilhões no mercado de capitais, a corretora de investimentos gaúcha Warren fez, pela primeira vez, captação para uma empresa de capital aberto, no valor de R$ 24 milhões. A operação de crédito em Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) para a Melnick, que também tem origem no RS, visa "encurtar o ciclo" de recebíveis de loteamentos no litoral gaúcho da Melnick Arcádia, subsidiária da incorporadora, diz o líder de mercado de capitais da Warren, Gustavo Kosnitzer.

- Integramos uma fintech (empresa de finanças e tecnologia) com uma empresa do setor tradicional, de incorporação e construção - destaca.

A maior parte do produto financeiro teve sua distribuição entre clientes da Warren com patrimônio acima de R$ 10 milhões. O rendimento é de IPCA + 9% ao ano, com isenção de imposto. _

Conforme a própria Receita, o imposto dos super-ricos vai arrecadar R$ 34,14 bi em 2026, acima do valor estimado da renúncia tributária, de R$ 27 bilhões. A "folga", segundo o Fisco, será para restituir o IR que teve retenção na fonte.

GPS DA ECONOMIA

Nenhum comentário: