segunda-feira, 11 de janeiro de 2016


11 de janeiro de 2016 | N° 18411 
L F VERÍSSIMO

O i-mencionável


Da série “Quem diria?”. Comecei a ter um espaço assinado no jornal em 1969, na chamada “época brava” da ditadura. Governo Médici, censura à imprensa... Tudo que tem gente desfilando hoje para trazer de volta. A gente vivia testando os limites do que podia ser dito. Não era raro escreverem-se crônicas que, obviamente, não seriam publicadas, só para desabafar. Nesses casos, tinha-se sempre uma crônica de reserva, sobre a vida sexual dos anjos, para substituir a censurada. Apelava-se muito para metáforas, na esperança de que os leitores entendessem as referências veladas à repressão, o que quase nunca acontecia. 

Alguns limites do permitido eram claros. Críticas ao governo ou a militares, nem pensar, por exemplo. Outros limites eram menos explícitos. Certa vez, proibiram uma crônica minha para o rádio porque comentava a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies, que, tantos anos depois da sua publicação, não teria mais nada de subversiva. Nunca entendi. Talvez a teoria da evolução lembrasse macacos, macacos lembrassem gorilas e gorilas lembrassem, metaforicamente, generais. Enfim, os tempos eram assim.

O que definitivamente não podia era mencionar certos nomes. Dom Hélder Câmara, jamais. E mais grave ainda: Brizola. Se pudesse, a ditadura não só proibiria que se pronunciasse o nome Brizola em todo o território nacional como invadiria o cartório em que seu nascimento foi registrado e queimaria tudo, apagando qualquer traço da sua existência. Ou mandaria exterminadores ao passado para eliminar sua ascendência por várias gerações. 

No fim, sua existência não pôde mais ser negada e a ditadura permitiu sua volta ao Brasil e à sua carreira. E o perigoso agitador, a alternativa armada e voluntariosa à moderação do Jango, o fantasma que assombrou os generais durante tanto tempo, o i-mencionável Brizola, ainda teve uma respeitável sobrevida política.

Há dias, o nome de Brizola foi incluído, quem diria, no Livro dos Heróis da Pátria, no Panteão da Pátria e da Liberdade Nacionais. Brizola finalmente mencionado, com honras.

QUEM DIRIA 2

No Peru, pode acontecer uma reabilitação como a do Brizola, mas ao contrário. Lá, está em ascensão política uma filha do Fujimori, aquele presidente cujas ideias neoliberais chegaram a ser consideradas extremas até pelo Vargas Llosa, e que roubou o que podia roubar e fugiu. Ou fujiu. Agora, a família está de volta, com boa chance chegar ao poder.

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