quarta-feira, 20 de janeiro de 2016



20 de janeiro de 2016 | N° 18420 
DAVID COIMBRA

Brizola, Collor e Lula – II


Durante um debate de TV, no final da campanha de 1989, Brizola fez um pronunciamento que emocionou o Brasil. Foi o chamado “Discurso do Não Rotundo”, em que implorava, com voz embargada, que os brasileiros não votassem em Collor ou em Silvio Santos (que acabou não se candidatando). “Não vote em Brizola, se essa for a sua consciência”, dizia Brizola. “Há outros candidatos dignos. Mas não vote nesses dois!”

Passados menos de três anos, Brizola aliou-se a Collor. Foi praticamente o único líder político brasileiro que se posicionou contra o impeachment. Brizola dizia que o impeachment de Collor era... adivinhe: Golpe.

Aquele consórcio ilógico não passou de negócio de ocasião. Brizola tentou trocar seu apoio pelo sonho de espalhar escolas em tempo integral pelo país. Não deixou de ser um idealismo inocente do velho Leonel.

Deu certo, em parte. Brizola conseguiu plantar escolas integrais em morros do Rio e beneficiou milhares de crianças. Mas aquele foi, na prática, o seu suicídio político.

Brizola, na época, era governador do Rio, e havia sido um dos grandes personagens da eleição de 1989. Tinha patrimônio eleitoral. Lula e os líderes do PT viram, em seu posicionamento contra o impeachment, a oportunidade de tomar aquele patrimônio e ocupar aquele espaço. Passaram a trabalhar, com muita competência e intensidade, para grudar em Brizola os rótulos de caudilho populista e ultrapassado, no que, de alguma forma, tinham razão, e até de caduco, no que, obviamente, não tinham.

Em alguns meses, Brizola viu quase destruída uma história de mais de 40 anos. Na eleição de 1994, ele somou 3% de votos e ficou atrás até de Enéas Carneiro e Orestes Quércia. Sua derradeira tentativa de chegar ao poder foi como coadjuvante do seu algoz: em 1998, candidatou-se a vice de Lula. E perdeu.

Pois é precisamente neste ponto que pretendia chegar. A eleição de 1998.

Houve uma inflexão no PT, a partir de 1998. Depois daquela derrota, a terceira, o partido em geral e seu principal líder em particular mudaram de comportamento. Lula e o PT abriram-se em definitivo para alianças.

Todo tipo de alianças. Com todo tipo de aliados.

Para se eleger em 2002, Lula concorreu com um vice do PL e, depois de eleito, utilizou, exatamente, a lógica de Brizola: os que se aproximavam dele não o comprometiam; ao contrário, aproximavam-se da luz.

Será que Brizola teve algum papel nessa transformação de Lula? Será que a convivência dos dois durante a campanha fez Lula convencer-se de que, se não mudasse de comportamento, não chegaria ao poder? Ou será que Lula sempre pensou assim, e só aproveitou o novo revés para modificar o partido?

Seja como for, o fato é que Lula fez o que Brizola faria: aliou-se a personagens como Sarney, Renan Calheiros, Maluf e, finalmente, ao terceiro protagonista desta nossa história, Collor.

Aí está. Entendo todos os outros, mas... Collor?

Collor não é como um Calheiros ou um Temer, nunca foi um homem de partido. Tampouco tem a liderança regional de um Sarney. E, no Congresso, não conta com o número de votos de um Eduardo Cunha. Por isso, resta a pergunta: por quais insondáveis razões Lula deu a Collor tamanho poder e prestígio no governo e na Petrobras?

Ainda vou escrever mais sobre Collor. Entrevistei-o, como entrevistei Lula e Brizola, e percebi que não se trata de um ser humano, digamos, comum. Por ora, para não aborrecer o leitor, fico por aqui. E deixo, como reflexão acerca das duas últimas colunas, o primeiro salmo que o rei meu xará escreveu há 3 mil anos: “Feliz quem não segue o conselho dos maus”. Ou, na velha e sábia versão popular:

“Diga-me com quem andas, e te direi quem és”.

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