quarta-feira, 6 de janeiro de 2016



06 de janeiro de 2016 | N° 18406 

MOISÉS MENDES

As sufragistas

As mulheres devem levar seus homens, de arrasto se for preciso, para ver As Sufragistas. Um dos personagens mais fortes desse belo filme é um homem. No meio das mulheres do início do século 20, que lutam em Londres pelo direito de votar, aparece a figura do macho atormentado.

Não é o sem-graça Sonny (Ben Whishaw), marido da personagem principal, a operária Maud Watts (Carey Mulligan). É o inspetor Arthur Steed (Brendan Gleeson), encarregado de vigiar, reprimir e prender as malucas que saem pelas ruas gritando pelo voto.

Não pretendo fazer a resenha do filme, porque isso é atribuição do Feix, do Lerina e do Perrone aqui na Zero. Vou só dizer que fiquei comovido com a performance soberba do irlandês Brendan Gleeson, pela capacidade de dar vida a um personagem à altura da Maud de Carey Mulligan.

Pena que a diretora Sarah Gavron tenha evitado um duelo entre os dois. No cinemão americano, o embate entre a moça que adere de gaiata aos levantes feministas e o grandalhão que a persegue teria ido além do que aparece no filme.

O inspetor Steed de hoje é o macho que ainda arrasta convicções, mas se vê atormentado não só com as mulheres, mas com os gays e suas conquistas. Você conhece muita gente como o barbudo que vigia Maud.

Não o machão grotesco tipo Bolsonaro, o covarde que ataca mulheres, negros e homossexuais, mas o sujeito contidamente constrangido com a tarefa de ser guardião de uma moral cada vez mais incerta e difusa. Os nossos Steed do século 21 sofrem com outros tormentos.

Viver era arriscado para as mulheres, lá em 1912, e viver, namorar e casar-se ainda é um risco para os gays em Londres, Porto Alegre ou Nova York. Vivem, namoram e até se casam, mas sob o olhar de gente como Steed, orientada para vigiar e punir, em nome das pessoas “normais”, como acontecia em Londres.

O filme parece curto demais para o muito que tem a contar. Mas tem o suficiente para reforçar a sensação de que os grandes saltos transformadores de condutas, a partir do século 20, foram os promovidos por gestos das mulheres ou sob a inspiração delas.

E os homens? Os homens sabem guerrear, como diz Maud. Por isso ainda se assustam com casamentos de gays em CTGs – assegurados por uma mulher, a juíza Carine Labres, de Livramento.

Quem ainda teme as mulheres e acha que vem melhorando deve se submeter ao teste de As Sufragistas. A recomendação vale para os que, na versão mais reacionária do macho inseguro do século 21, também temem os gays.

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