terça-feira, 12 de janeiro de 2016


12 de janeiro de 2016 | N° 18412
MÁQUINAS

Crise, demissões e incertezas

Vendas da indústria caíram 34,5% em 2015, pior resultado desde 2007. No Rio Grande do Sul, 9 mil trabalhadores perderam seus empregos somente no ano passado

Metalúrgico há 20 anos, Renato Marques de Melo se recorda bem das últimas três crises enfrentadas pela indústria de máquinas agrícolas no Rio Grande do Sul onde estão instaladas 65% das fábricas do setor no Brasil. Em todas as situações, perdeu o emprego, passou por dificuldades e depois foi readmitido. As lembranças recentes, ocorridas num período de 10 anos, trazem esperança ao trabalhador desempregado há oito meses.

– Nas outras vezes, a situação melhorou e me chamaram de volta – conta o metalúrgico de 48 anos.

Funcionário da fábrica de colheitadeiras da Massey Ferguson, em Santa Rosa, no noroeste do Estado, Melo recebeu a notícia da demissão em maio do ano passado. O argumento para o desligamento foi o mesmo ouvido em 2005 e 2008: queda das vendas.

A primeira demissão, com cinco anos de empresa, ocorreu por conta de uma das maiores secas da história, na safra 2004/2005. Readmitido em 2007, ficou empregado até ouvir novamente no ano seguinte que a fábrica teria de readequar-se ao momento econômico. Na época, o Brasil sofria os impactos de uma das piores crises financeiras mundiais. O retorno ao trabalho ocorreu no final de 2009.

Desde então, a indústria de máquinas e implementos agrícolas passou a bater sucessivos recordes de vendas, beneficiada por safras cheias, crédito farto e juro baixo. No começo de 2015, quando o mercado começou a dar sinais de que o crescimento das vendas estava com os dias contatos, o trabalhador começou a ver o filme se repetir.

A partir da saída da fábrica, onde ganhava salário líquido de R$ 1,3 mil por mês como operador de máquinas, Melo passou a fazer bicos na construção civil, sem carteira assinada e nem benefícios. Na empresa, tinha plano de saúde para a mulher e os três filhos.

– Hoje, se eu precisar de um médico, tenho que amanhecer em um posto de saúde para conseguir ficha – lamenta.

DEMISSÕES AFETARAM 27% DOS FUNCIONÁRIOS DAS FÁBRICAS

O drama vivido pelo metalúrgico de Santa Rosa é o mesmo de outros 9 mil trabalhadores da indústria de máquinas agrícolas e fornecedores que perderam seus empregos em 2015, conforme a Federação dos Metalúrgicos do Rio Grande do Sul. O número representa 27% das vagas do setor em todo o Estado, em torno de 33 mil, antes dos cortes.

– Sabemos que as empresas estão se esforçando para não demitir, até porque as crises são cíclicas e esses trabalhadores deverão ser buscados novamente – aponta Jairo Carneiro, presidente da federação.

As dispensas ocorreram no ano em que o setor de máquinas agrícolas e rodoviárias sofreu uma queda de 34,5% nas vendas internas, segundo números consolidados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). O resultado de 44,9 mil unidades vendidas em 2015 foi o mais baixo desde 2007 (veja quadro).

E se os números de 2015 preocupam, os de 2016 trazem pouco alento. A entidade prevê uma recuperação de 2%. O ano começou sem o Programa de Sustentação do Investimento (PSI) e com mudanças nas regras do Finame Agrícola, que desde o começo do ano passou a ser vinculado à Taxa de Juro de Longo Prazo (TJLP), que varia a cada três meses.

– O agricultor tem um trauma muito forte com esses financiamentos variáveis, quando ele comprava uma máquina e pagava duas – lembra Claudio Bier, presidente do Sindicato das Indústrias de Máquinas e Implementos Agrícolas (Simers), que estima demissões em 2015 na ordem de 6 mil trabalhadores.

Na opinião do presidente da Anfavea, Luiz Moan, a taxa variável do TJLP não deve prejudicar os negócios, pelo contrário, já que o juro de 7,5% é bem inferior a taxa básica de juro, hoje em 14,25%. O índice é o mesmo do Moderfrota, que não sofreu modificações.

– E ainda existe a possibilidade da TJLP ser reduzida. Dessa forma, temos previsibilidade do mercado – considera Moan.

joana.colussi@zerohora.com.br

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