terça-feira, 1 de setembro de 2015




01 de setembro de 2015 | N° 18281 ARTIGO
DIONE KUHN*

A SOMBRA DO VICE


O convívio entre Dilma Rousseff e Michel Temer sempre foi marcado pela frieza e desconfiança. A presidente teve de engolir a indicação de Temer para vice na eleição de 2010. O PT precisava de apoio do principal partido no Congresso, o PMDB, para conseguir governar. Aliás, pelo sistema atual, nenhum governo sobrevive sem os peemedebistas. Ele passou o primeiro mandato na berlinda, enquanto ela surfava na popularidade alta.

O menosprezo da presidente por Temer era evidente em solenidades, discursos e reuniões internas. Uma ojeriza por alguém que é mestre em articular, tramar. Político tarimbado que é, Temer manteve o semblante de esfinge e não alterou o tom de suas frases milimetricamente calculadas.

O vice-presidente alijado do primeiro mandato não existe mais. Com o aprofundamento da crise, é ele quem agora se distancia estrategicamente da presidente. Considerado um dos políticos mais habilidosos do país – a sua capacidade de estar há décadas próximo do poder é a comprovação disso –, Temer já fez pelo menos três movimentos nas últimas semanas que mostram, no mínimo, a intenção de não se deixar contaminar pela crise.

Primeiro, disse que o país precisa de “alguém que tenha a capacidade de reunificar a todos”. Se realmente quisesse se referir a Dilma como sendo esse “alguém”, bastava ter citado o nome dela, evitando a polêmica e a deterioração da sua relação com a presidente. 

O segundo passo foi deixar a articulação política. E, por fim, ter deixado vazar o seu aborrecimento ao saber que Dilma, sem informá-lo, havia reunido um grupo de ministros para debater a volta da CPMF. Ao receber posteriormente um telefonema da presidente pedindo a sua ajuda na articulação para aprovar a volta do imposto, Temer se recusou e “sugeriu” que ela mesma a fizesse.

Com um governo cada vez mais fragilizado, o afastamento de Temer é um sintoma de que ele pretende se preservar politicamente para uma eventual renúncia ou impeachment da presidente.

Em qualquer uma das hipóteses, quem assume o comando do país é o vice.

*Editora de Notícias / dione.kuhn@zerohora.com.br

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