21 de setembro de 2015 | N° 18301
L. F. VERISSIMO
Conspiração
Coitado de quem, no futuro, tentar entender o que se passa no Brasil hoje. A perspectiva histórica não ajudará, só complicará mais. Havia uma presidente – Vilma, Dilma, qualquer coisa assim – eleita e reeleita democraticamente por um partido de esquerda, mas criticada pelo seu próprio partido por adotar, no seu segundo mandato, uma política econômica neoliberal, que deveria agradar à oposição neoliberal, que, no entanto, tentava derrubar a presidente – em parte pela sua política econômica!
Os historiadores do futuro serão justificados se desconfiarem de uma conspiração por trás da contradição. Vilma ou Dilma teria optado por uma política econômica contrária a todos os seus princípios para que provocasse uma revolta popular e levasse a uma ditadura de esquerda, liderada pelo seu mentor político, um tal de Gugu, Lulu, Lula, por aí. Como já saberá todo o mundo no ano de 2050, políticas econômicas neoliberais só aumentam a desigualdade e levam ao desastre.
Vilma ou Dilma teria encarregado seu ministro da Fazenda Joaquim (ou Manoel) Levis de causar um levante social o mais rápido possível, para apressar o desastre. Fariam parte da conspiração duas grandes personalidades nacionais, Eduardo Fuinha e Renan Baleeiro, ou coisas parecidas, com irretocáveis credenciais de esquerda que teriam voluntariamente se sacrificado, tornando-se antipáticos e reacionários para criar na população um sentimento de nojo da política e dos políticos e também contribuir para a revolta.
Outra personalidade que disfarçaria sua candura e simpatia para revoltar a população seria o ministro do Supremo Gilmar Mentes. Uma particularidade do Brasil que certamente intrigará os historiadores futuros será a aparente existência no país – inédita em todo o mundo – de dois sistemas de pesos e medidas. O cidadão poderia escolher um sistema como se escolhe uma água mineral, com gás ou sem gás. No caso, pesos e medidas que valiam para todo o mundo, até o PSDB, ou pesos e medidas que só valiam para o PT.
Outra dificuldade para brasilianistas que virão será como diferenciar os escândalos de corrupção, que eram tantos. Por que haveria escândalos que davam manchetes e escândalos que só saíam nas páginas internas dos jornais, quando saíam? Escândalos que acabavam em cadeia ou escândalos que acabavam na gaveta de um procurador camarada? Mas o maior mistério de todos para quem nos estudar de longe será o ódio. Nossa reputação de povo amável talvez sobreviva até 2050. Então, como explicar o ódio destes dias?
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