sábado, 12 de setembro de 2015



12 de setembro de 2015 | N° 18292
PARALELO 30 | Juarez Fonseca

Nas raízes do Brasil

TREZE DOCUMENTÁRIOS MOSTRAM um país que poucos conhecem

“O Brazil não conhece o Brasil, o Brazil nunca foi ao Brasil”, cantava Elis em 1978 na música Querelas do Brasil, de Aldir Blanc e Maurício Tapajós. Muitas coisas mudaram de lá para cá, mas na essência esse desconhecimento permanece. Tanto permanece, que um projeto como Visceral Brasil (As Veias Abertas da Música) é capaz de surpreender e emocionar qualquer pessoa com alguma sensibilidade. São 13 documentários sobre artistas populares de sete Estados, exibidos em 2014 pela TV Brasil e agora lançados em uma caixa de quatro DVDs. 

Com roteiros e direção da cineasta carioca Márcia Paraíso e curadoria da produtora cultural gaúcha Carla Joner, ambas experimentadas no trabalho com o universo da música de raiz, os documentários de 26 minutos cada são o que de melhor já foi feito no gênero, pelo conjunto e pela realização.

Outros projetos, como o essencial Rumos, do Itaú Cultural, já mapearam o país; mas este é diferente. Além de mostrarem os artistas em seus ambientes (cidades, casas, cozinhas, famílias, parceiros), os documentários abrem o olhar para o entorno paisagístico, as marcas das regiões, com cenas de grande plasticidade. 

Acompanhando os sotaques, Márcia, Carla e a equipe da Plural Filmes conseguiram criar uma linguagem própria para cada episódio. Alguns têm interferência externa, como comentários de terceiros; outros restringem-se ao universo do artista ou grupo. A riqueza das expressões pessoais e artísticas, das vidas inteiras nos longes (quase todos são idosos, vários são desdentados), frequentemente produzem um nó na garganta do espectador, uma saudade indefinível do Brasil. Mas o que perpassa os filmes é a alegria.

OS PERSONAGENS

Já relativamente conhecido, por ser uma instituição baiana, Mestre Bule Bule, 68 anos, é cordelista, cantador e sambador ligado à tradição sertaneja. “Patrimônio vivo” da Paraíba, a incrível Zabé da Loca, 91 anos, criou a família vivendo em uma caverna e tocando pífano. Pernambucano, Arlindo dos 8 Baixos tocou durante 23 anos com Luiz Gonzaga e deixou uma legião de seguidores. 

Cego e sem as duas pernas, tinha 71 anos quando gravou o documentário. Ícone do bumba-meu-boi de matraca, o maranhense Mestre Humberto deu seu depoimento aos 74 anos. Os tambores marcam a liderança de Dona Maria do Batuque, 82 anos, que vive em São Romão, norte de Minas. Outro de Pernambuco, o grupo mescla raízes indígena e negra. A herança afro também move o grupo Zambiapunga, do sul da Bahia.

São de Belém do Pará os três personagens mais “da moda” do Visceral Brasil: Mestre Laurentino, roqueiro de 88 anos, que só canta com banda de jovens; Mestre Vieira, 81 anos, tido como o criador da guitarrada; e Dona Onete, 77 anos, mestra na história da Amazônia, uma das definidoras do carimbó. Do extremo Norte, Rondônia, o projeto traz as manifestações dos índios Suruí, com participação de Marlui Miranda. 

E os representantes do extremo Sul são GibaGiba, 74 anos na época da gravação, mestre do tambor de sopapo e da negritude gaúcha; e Pedro Ortaça, 73 anos, remanescente da geração que criou a música missioneira no RS, com sua ideia de romper fronteiras e cantar opinando.

GibaGiba e Arlindo dos 8 Baixos morreram em 2014, antes da estreia do projeto na TV. Mestre Humberto morreu em janeiro deste ano.

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