segunda-feira, 21 de setembro de 2015



21 de setembro de 2015 | N° 18301 
DAVID COIMBRA

Lincoln, Zapata, César, Lênin e Pixuleco


Pixuleco sofreu grave atentado em Caxias do Sul, no fim de semana. Li essa notícia ontem. Você sabe quem é Pixuleco: é o boneco inflável gigante de Lula vestido de presidiário.

Um boneco de plástico esfaqueado furiosa e covardemente. É um fato que diz muito sobre nosso tempo e sobre como andam as coisas no Brasil.

Imagine que dois homens adultos, talvez até alfabetizados, saíram de casa armados com facas e com máscaras nos bolsos das calças. Ao chegarem ao centro da cidade, vestiram as máscaras, puxaram das facas e atacaram com ferocidade o boneco inflável, apunhalando-o como os senadores liderados por Brutus apunhalaram César aos pés da estátua de Pompeu, nos idos de março.

Segundo apurei, o boneco passa bem e sobreviverá. Mas, se consciência tivesse, certamente estaria preocupado. Há quem o ame, tanto que ele tem feito peregrinações pelo país, tornou-se personagem conhecido, virou notícia de jornal e sua reprodução aparece em eventos públicos, como o Rock in Rio. Mas também há quem o odeie de dentes rilhados. Não foi a primeira vez que o agrediram. Uma moça braba, integrante do famoso exército do Stédile, já o esfaqueou, d’outra feita.

Pixuleco está para o Brasil como Martin Luther King, Malcolm X, Lincoln e Kennedy estiveram para os Estados Unidos.

A vantagem dos admiradores de Pixuleco para os admiradores dos ídolos dos americanos é que, ainda que os soldados do exército de Stédile convocados por Lula, ainda que os guerrilheiros da CUT que ameaçam cavar trincheiras nas calçadas, ainda que os sequazes daquele deputado petista que disse que o impeachment será lavado com sangue, ainda que todos esses valentes se mobilizem para rasgar, queimar e fincar estacas no coração de Pixuleco, ele poderá ser construído de novo, igualzinho. Já vejo os defensores de Pixuleco bradando:

“Dos pedaços de um Pixuleco eliminado, mil outros nascerão!”

E Pixulecos se espalharão pelo Brasil do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte, conduzindo as massas a cantar, como cantavam os soldados que marchavam desde Marselha:

“Avante, filhos da Pátria! O dia da glória vos espera!”

E se o Brasil fosse rasgado por ferrovias, como agrada ao bom senso e desagrada à indústria automobilística, o Pixuleco seria nosso Lênin viajando rumo a alguma Estação Finlândia de Brasília e levando na bagagem a Revolução. Ou melhor ainda: poderíamos ter dois bonecos, o Pixuleco, do Lula, e a Pixuleca, da Dilma, um marchando do Norte e outro do Sul, como Pancho Villa e Emiliano Zapata fizeram no México, no começo do século 20. Atrás de Zapata e Villa, caminhavam os camponeses mexicanos, que eram como os sem-terra brasileiros, só que não profissionalizados, sem dinheiro do governo e sem apoio da Venezuela, eram apenas camponeses mesmo, homens que lidavam com arados e porcos, que se vestiam com pijamas brancos e marchavam debaixo de “sombreros”, entoando:

– Tierra! Tierra!

Sim. Seria melhor. Zapata é meu revolucionário preferido. Sempre cito um episódio ocorrido ao cabo dessa marcha, quando ele e Villa se encontraram na Cidade do México e tomaram o palácio do governo. Eles chegaram ao gabinete do presidente e decidiram posar para uma foto. Villa indicou para Zapata a cadeira de espaldar alto, a cadeira presidencial, e disse:

– Sente-se. Zapata, atrás de seu basto bigode, balançou a cabeça: – Sente-se você.

Pancho Villa se acomodou, e Zapata acomodou-se ao lado dele. A foto mostra os dois revolucionários lado a lado, com outros tantos ao redor. Villa está satisfeito, rindo, vitorioso, brejeiro, com um quepe militar na mão. Zapata não sorri. Tem o “sombrero” cobrindo o joelho e fita gravemente o fotógrafo com seus olhos de sanpaku. Parece antecipar o que ocorrerá mais tarde, quando desistirá da presidência e voltará para sua terra natal, Morelos, explicando sua decisão com uma única frase, sempre e sempre repetida:

“O poder corrompe”.

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