06
de agosto de 2014 | N° 17882
MARTHA
MEDEIROS
Era uma vez
Torres
Tenho
acompanhado o debate em torno do novo plano diretor de Torres, cidade onde
passei os melhores momentos da infância e adolescência, e que se mantém viva na
minha memória afetiva. Até 2006, tinha apartamento na cidade, e ainda sonho em
ter outro refúgio onde possa estar perto do mar, porém não mais lá.
Ao
ler sobre a possível autorização para construir prédios de até 10 andares na
orla, minha primeira reação foi ser contra. Concordei com quem é desfavorável à
mudança da lei: haverá menos tempo de sol batendo na praia, descaracterização
do cenário, menos ventilação natural etc. Mas, depois, com desânimo, refleti: a
esta altura, que diferença faz?
Já
viajei bastante e posso dizer que, em termos de belezas naturais, Torres é
páreo para vários outros cartões-postais do planeta. As formações rochosas que
se estendem da praia da Cal até a praia da Guarita, e as dunas logo atrás,
produzem um efeito dramático espetacular. O mar pode não ser cristalino, mas
compõe a cena dignamente. Seria um dos pontos turísticos mais valorizados do
Brasil, não fosse todo o resto.
E o
resto são ruas esburacas e desniveladas, cômoros que se amontoam calçadão
adentro, pouca arborização, nenhum cinema, vida noturna precária, comércio idem
(estou falando como turista, não como moradora, pois imagino que os moradores
tenham reivindicações mais urgentes).
Ainda
na visão de turista: surpreende que sejam os donos de bares e restaurantes os
maiores apoiadores da urbanização vertical a fim de alavancarem seus negócios.
Logo eles, que, salvo exceções, não investem em seus próprios estabelecimentos,
ignorando questões como boa iluminação, boa música, aconchego, fachada decente.
Torres parece ter esquecido noções básicas de bom gosto. Quer ser grande sem
atentar para o quanto se tornou feia, desprezando sua vocação para ser um hot
spot. Cidades feias não atraem visitantes, não geram comentários positivos, não
viram destino de lua de mel.
Sei
que não adianta ser nostálgica e querer que Torres volte a ser aquela charmosa
praia familiar onde aconteciam os campeonatos de surf, as festas na sede da
SAPT, os piqueniques em Itapeva, os jogos de vôlei nos amplos quintais das
casas dos veranistas. Foi outro tempo, e não se pode deter o desenvolvimento,
mas pode-se tentar preservar o espírito do lugar, crescendo ordenadamente e com
foco: Torres não é um subúrbio qualquer, e sim um local diferenciado pelo seu
recorte geográfico. Isso não deveria ter sido desconsiderado.
Mas
foi. Torres perdeu o timing, cresceu demais sem elaborar um projeto para honrar
a cidade privilegiada que era. Agora é difícil recuperar o potencial
desperdiçado. Já que não vingou como merecia, talvez seja mesmo hora de um
plano B – vá que funcione imitar Camboriú.
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