terça-feira, 1 de julho de 2014


01 de julho de 2014 | N° 17846
LUÍS AUGUSTO FISCHER

RADAR DA LÍNGUA

Estou sempre com o radar ligado no que se refere à língua, aos usos, às variações, às sutilezas. Escrevi meu livro mais bem-sucedido, o Dicionário de Porto-Alegrês (L&PM), assim mesmo, prestando atenção ao que se dizia, ao que eu dizia, ao que meus amigos falavam, ao que os velhos murmuravam. Levei uns 15 anos, mais ou menos, apenas anotando, juntando pequenos papéis com palavras, amontoando tudo em uma caixa literal de sapatos, até que achei um jeito de escrever sobre elas, que resultou no livro, lançado em 1999 e ainda agora com circulação apreciável.

(Comecei a escrever o livro ainda antes de ter um computador pessoal, em cadernos. No processo de escrita comprei meu primeiro PC, que me facilitou enormemente a coisa. Aí por 1994, tive o grande, o imprescindível auxílio de um programinha que me proporcionou botar em ordem os verbetes sem fazer maior força. Autor do programa? Nei Lisboa, ele mesmo.)

Agora tenho filhos pequenos, e o encanto de ouvir me retornou com muita força. Fico bispando o que dizem, atento, querendo ver o jeito e o rumo das mudanças, que são inevitáveis em tudo, ainda mais na língua falada, esta que é por natureza incontrolável e sujeita aos humores e às modas – e, por isso mesmo, tão legal de ver.

Não é raro me dar conta de que cada vez mais o repertório das atividades infantis não está mais recoberto por palavras especiais, locais, distintivas daqui de Porto Alegre ou do sul. Em festa infantil já ocorre com frequência ouvir chamarem os balões de bexigas. Minha filha de quatro anos conheceu o jogo de sapata como amarelinha. Já faz algum tempo que pandorga, por sinal bem rara de ver aqui na cidade, virou pipa ou papagaio.

Talvez faça parte da rotina essa mudança, que homogeiniza a linguagem pela força dos programas de televisão concebida para crianças, cuja voz é, em cem por cento dos casos, seja em locução original ou em dublagem, feita fora do Rio Grande do Sul, em Rio ou São Paulo, com uma exceção em Minas, que eu saiba. Meus filhos falam a linguagem que falamos em casa, mas também a que ouvem na tevê e que é repetida pelos amigos e colegas.


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