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sábado, 5 de fevereiro de 2011
05 de fevereiro de 2011 | N° 16602
PAULO SANT’ANA
O psicanalista mudo
Compareci anteontem à primeira sessão com um novo psicanalista.
De cara, o psicanalista me perguntou: “Quais são, no teu entender, as tuas qualidades e os teus defeitos?”.
Respondi de pronto: “Sobre as minhas qualidades, informe-se com meus inimigos. Quanto aos meus defeitos, telefone para minha sogra”.
Aliás, os psicanalistas se dividem em dois tipos: os que só ouvem e os que dialogam com os pacientes.
Os que só ouvem seguem um princípio: não têm de ficar desperdiçando palavras com o paciente, têm que falar pouco e, quando falarem, devem dizer a verdade. Entendem que, se forem falar muito, acabarão dizendo coisas inconvenientes ou não verdadeiras.
Da minha parte, exijo que o psicanalista que me atende fale comigo. Que se instale entre nós um locutório, que é aquele compartimento entre grades em que fala a monja que está internada no convento e as pessoas de fora que vão visitá-la.
Não consinto que fique só eu falando e o analista ouvindo, um monólogo estafante, um solilóquio que não leva a nada.
Quero que o que eu diga ao psicanalista seja rebatido por ele, que ele coloque observações a cada período das minhas confissões.
Por falar nisso, a análise, no meu entender, se aproxima muito da confissão, é uma declaração dos próprios pecados, uma autópsia do comportamento e da mobilização do analisado para os embates da existência.
Uma vez, não sei se já contei aqui, topei com um analista que não falava, só queria escutar.
Então, preguei uma peça naquele terapeuta. Ele não falava e eu também não. Quando ele me fazia uma pergunta, eu respondia com um monossílabo: “sim” ou “não”, “está bem”, “nada disso”, “isso mesmo”.
Eu estava enlouquecendo o analista.
Até que ele se entregou e resolveu conversar comigo, me dar conselhos, me indicar rumos.
Mas foi um fracasso a nossa relação, que terminou em seguida: o psicanalista não estava preparado para conversar, ele se educou profissionalmente para só ouvir. Foi um desastre a nossa tentativa de colóquio.
Eu concordo que o psicanalista não deva ser verborrágico, mas também não admito que ele seja mudo. Pelo menos, tem o dever de dar algumas bicadas.
É muito chato e frustrante topar com um psicanalista calado, cujas únicas palavras durante uma sessão de 50 minutos sejam estas: “Vai pagar a consulta em dinheiro, com cheque ou no cartão?”.
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