sexta-feira, 7 de janeiro de 2011



Berço, chão e túmulo das palavras

Dizem que a gente só vai morrer de verdade depois que ninguém mais nos lembrar. Acho que acontece mais ou menos a mesma coisa com as palavras.

Elas só ficam enterradas em definitivo em algum vetusto dicionário encoberto pela pátina do tempo depois que ninguém mais as fala, escreve ou pesquisa, tipo assim, por exemplo, convescote, que morreu cedo, ainda bebê, ao tentar substituir piquenique (do ingl. picnic).

Hoje em dia, aliás, não se fala muito em piquenique, né, meu chapa? Nem sempre as palavras morrem quando o objeto, a profissão ou alguma outra coisa desaparece.

Carro de praça virou táxi. Carro de praça era palavra mais lenta, elegante, espaçosa, com motorista de quepe, sapato lustrado, paciência e até gravata. Táxi é palavra mais rápida, mais urbana, vapt-vupt, Nova Iorque, por aí. Pederasta é vocábulo politicamente incorreto, eivado de preconceito, que é preferível deixar estertorando no léxico, que, diga-se, diz que pederastia era vício, imagine só!

Mulher da vida e mulher de vida fácil ficaram nos anais, sem trocadilhos infames, por obséquio. Flor da idade e tenra infância são palavras que envelheceram, encarquilharam, junto, aliás, com macróbio, nosocômio, manicômio e encômio, que eram do tempo das rimas pobres e de poetas mais bem aquinhoados.

Te lembra de Pinel, o nome do médico e o apelido dos pacientes tipo assim amentais, oligofrênicos, oligões e que hoje são apenas fora da casinha, portadores de deficiências, malucos-beleza ou meio diferentes?

Solteirona, solteirão e, principalmente, solteirão empedernido ficaram, literalmente, petrificados, para titios, e terminaram seus dias em alguma casa de cômodos perdida no beco de algum arrabalde, diga-se de passagem, nas cercanias das casas sem eira nem beira de algum rábula de fim de linha, de um oloroso cubeiro ou de um modesto amanuense, que, depois de sete lustros de labor na repartição pública, solicitou seu direito ao ócio com dignidade, para jubilar-se no recesso de seus aposentos.

Depois dos prolegômenos e do mérito, sem maiores delongas, vou tentando encerrar esta modesta mas percuciente crônica com chave de ouro, lamentando se não consegui ser supimpa e, se porventura, deixei meus preclaros e conspícuos sete leitores a ver navios. À guisa de defesa, refiro que total apedeuta procuro não ser. Passar bem, bons dias! Queridos leitores, venturoso 2011!

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