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sábado, 29 de janeiro de 2011
29 de janeiro de 2011 | N° 16595
NILSON SOUZA
A lição de Camila
Fiz três vestibulares na UFRGS e tenho diplomas de duas faculdades, a queridíssima Fabico (Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação) e a não menos amada Esef (Escola Superior de Educação Física). Significa que, numa das tentativas, fui reprovado com louvor – exatamente na primeira, quando recém concluíra o ensino médio da minha época. Foi horrível.
Ninguém me cobrava nada, minha família era muito mais ligada ao mundo do trabalho braçal do que ao universo das letras, mas eu me senti arrasado, destruído, humilhado. Afinal, aquele era o meu teste de serventia para a vida. Se não era capaz de passar num exame de seleção depois de tantos anos de estudos, talvez eu fosse mesmo um inútil.
Queria, e queria muito, ver o meu nome naquela lista, ser reconhecido pelos colegas, celebrar com eles o sucesso da aprovação. Mas tive que curtir por vários dias a minha fossa, sem qualquer perspectiva de consolo, pois, se as vitórias costumam ser coletivas, a derrota é sempre individual. Como é doloroso encarar um tropeço, especialmente quando se está tentando romper a barreira de emoções que separa a adolescência da idade adulta.
Mas passou. O tempo, como escreveu no peito da camisa um presidente de triste lembrança, é mesmo o senhor da razão. Pena que na adolescência a gente tem pouca consciência disso, acha que tudo deve acontecer rápido, do jeito que queremos. Hoje penso que aquela reprovação acabou sendo uma consistente lição de paciência.
Como não tinha a mínima condição financeira para estudar numa universidade privada, tive que engolir a frustração e me preparar melhor para o exame seguinte. Alcancei o meu objetivo, com um lucro adicional: aprendi que persistir é mais importante do que conquistar tudo com facilidade.
Meu tempo é outro, minha experiência talvez nem tenha significado para a meninada de hoje. Mas a experiência de Camila Chiodi tem. Ela foi a primeira colocada no recente vestibular da UFRGS e vai cursar Medicina, como sempre sonhou.
É provável que tal performance tenha despertado invejas nos garotos e garotas da sua idade. Quem não gostaria de ser Camila? Pois esta jovem de 21 anos, que chegou na frente de 5 mil aprovados e de outros 30 mil que ficaram de fora, vinha de quatro reprovações.
Isso mesmo: por quatro anos consecutivos, ela deve ter sentido a mesma desilusão que eu senti na minha época e que estão sentindo hoje milhares de meninos e meninas que não viram seus nomes no listão.
Sei bem que isso não serve de consolo – e nem acho que se deve tentar consolá-los. Creio que aprender a administrar as próprias frustrações faz parte do processo de amadurecimento pessoal.
Mas tenho certeza de que sairão mais fortalecidos da experiência aqueles que entenderem melhor a lição de Camila sobre essa matéria intangível chamada Persistência, que nem sempre a escola ensina, mas que acaba caindo em todos os vestibulares da vida.
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