sábado, 29 de janeiro de 2011



30 de janeiro de 2011 | N° 16596
ARTIGO | Robert J. Schiller


A ECONOMIA DO POVO

Estamos no meio de um crescimento explosivo na economia popular: livros, artigos, blogs, palestras públicas, tudo seguido de perto pelo público geral. Recentemente, participei de um painel que discutia esse fenômeno na reunião anual da Associação Americana de Economia, em Denver.

Um aparente paradoxo emergiu da discussão: a expansão na economia popular vem em uma época em que o público geral parece ter perdido a fé nos economistas profissionais, porque quase todos nós falhamos em prever, ou mesmo em avisar, sobre a atual crise econômica a maior desde a Grande Depressão.

Então, por que o público está comprando mais livros de economistas profissionais? A explicação mais interessante que ouvi foi a de que a economia tornou-se mais interessante, porque não parece mais ser uma disciplina pronta e fechada. Não há diversão em ler um livro ou um texto que diz que a previsão econômica é melhor se deixada para modelos gerados por computadores que você, o leitor comum, precisaria de um Ph.D. para entender.

Todos os debatedores dizem, de uma maneira ou de outra, que a economia popular facilita a troca entre economistas especializados e o público mais amplo, um diálogo que nunca foi mais importante do que agora. Afinal, a maioria dos economistas não sentiu a chegada da crise em parte porque haviam se excluído de saber o que faziam e pensavam as pessoas no mundo real.

A economia popular de sucesso envolve o leitor ou o ouvinte, de certo modo, como um colaborador. Até recentemente, muitos economistas profissionais relutariam a escrever um livro popular. Certamente, não seria visto de forma favorável ao considerar-se um candidato para um cargo ou uma promoção. Já que não inclui equações ou tabelas estatísticas, eles diriam, não é um trabalho sério que vale a atenção dos acadêmicos.

Imagine como os profissionais de medicina veriam um de seus membros que recomendasse ao público geral alguma terapia que ainda não houvesse passado pelo escrutínio das autoridades competentes.

Profissionais da medicina sabem a frequência em que uma nova terapia, que parece promissora, acaba sendo comprovada como ineficaz ou mesmo perigosa, depois de estudo mais cuidadoso. Há um rigoroso processo de revisão acadêmica das novas terapias propostas, associadas com publicações profissionais que detêm altos padrões de pesquisa. Passar por cima desse processo e promover ao grande público ideias novas que ainda não foram testadas não é profissional.

Nas décadas que precederam a atual crise financeira, economistas gradualmente vieram a se enxergar do mesmo modo, encorajados pela tendência de pesquisas. Por exemplo, depois de 1960, quando a Universidade de Chicago começou a criação de uma fita de computador Univac que continha informações sobre milhões de preços de ações, muita pesquisa científica nas propriedades de preços de ações foi tomada como confirmação da “hipótese dos mercados eficientes”.

As forças competitivas que são a base da bolsa de ações pareciam forçar o preço dos títulos de crédito a seus valores reais fundamentais. Todo o esquema de comercialização que não estava baseado nessa hipótese era rotulado como fraude, mal conduzida ou direta. A ciência havia triunfado sobre a opinião dos especialistas de mercado – ou era o que parecia.

A crise financeira foi um golpe fatal nessa superconfiança na economia científica. Não é apenas que a profissão não previu a crise. Seus modelos, tomados literalmente, muitas vezes sugeriam que uma crise dessa magnitude não poderia acontecer. Uma maneira de interpretar é que a profissão de economista não tinha em plena conta o elemento humano da economia, um elemento que não pode ser reduzido à análise matemática.

Os relativamente poucos profissionais de economia que avisaram sobre a crise atual eram pessoas, ao que parece, que não apenas liam a literatura econômica acadêmica, mas que também traziam um julgamento mais pessoal: comparações intuitivas com episódios históricos passados, conclusões sobre especulação, bolhas de preço e estabilidade da confiança, avaliações do propósito moral dos atores econômicos e impressões que a complacência havia se instalado, seduzindo os fiscalizadores a relaxar.

Esses eram julgamentos feitos por economistas conhecedores da nossa liderança empresarial – suas inspirações, crenças, subterfúgios e racionalizações. Suas visões jamais poderiam ser submetidas a uma publicação acadêmica e avaliadas como é feito um procedimento médico. Não há procedimento científico que poderia provar sua validade.

Como colocou o economista Edwin R. Seligman em 1889, “economia é uma ciência social, ou seja, é ciência ética, e portanto histórica... Não é uma ciência natural e, portanto, não é uma ciência exata ou puramente abstrata.”

Para mim, e sem dúvida para outros debatedores, parte do processo de perseguir os aspectos inexatos da economia é falar honestamente ao público mais amplo, olhando-o nos olhos, aprendendo com ele, lendo os e-mails que manda, e então buscando a alma para decidir se a teoria escolhida por um autor realmente está próxima da verdade.

Robert Shiller, professor de Economia na Universidade de Yale e economista-chefe na MacroMarkets LLC, é coautor, com George Akerlof, de O Espírito Animal: Como a Psicologia Humana Impulsiona a Economia e a sua Importância para o Capitalismo Global.

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