quinta-feira, 6 de janeiro de 2011



06 de janeiro de 2011 | N° 16572
L. F. VERISSIMO


Detalhes

Não quero fazer intriga, mas, na hora de ser cumprimentada pelos representantes estrangeiros depois da posse, a Dilma recebeu a Hillary e o Hugo Chávez com a mesma efusão – mas deu um passo à frente para receber a Hillary. Não sei o que isso possa sinalizar sobre novas diretrizes para nossa política externa, mas deu na vista.

A posse esteve cheia de detalhes assim. Da sua entrada na Câmara até chegar à mesa onde seria diplomada, a Dilma foi distribuindo beijos, e aí também se notou uma variação com possíveis conotações políticas. Em alguns, ela dava um beijo, em outros dois beijos.

É verdade que alguns (do PMDB), depois de receberem um beijo da Dilma, se apressavam a ficar na frente dela de novo para receber outro, mas assim mesmo a quantidade de beijos deve ter significado algo. Estabeleceu-se uma hierarquia instantânea, os beijados e os bi-beijados, que pode muito bem se refletir em futuras votações no Congresso.

O tempo gasto com beijos também marcou a primeira grande diferença de se ter uma mulher na Presidência. Eu não me lembro de nenhum presidente ter custado tanto a chegar à mesa por ter ficado distribuindo beijos no caminho. Nem o Itamar, nas mulheres.

O detalhe mais simpático da festa foi a Dilma na base da rampa do palácio e o Lula no topo, os dois se enxergando pela primeira vez naquele dia, e ela abrindo os braços como quem diz “olha nós aqui: dá pra acreditar?”. E ele fazendo o mesmo gesto lá de cima.

A incredulidade com o que estava acontecendo deve ter acometido muita gente, a começar pela Dilma e o Lula. E o detalhe mais bonito do dia, claro, foi a Marcela Temer.

Já contei mais de uma vez que um dia vi o Millôr arrancar aplausos entusiasmados de uma plateia, durante a Jornada Literária de Passo Fundo, com a leitura de um magnífico discurso em defesa das liberdades democráticas.

Quando terminaram os aplausos, o Millôr revelou que acabara de ler o discurso de posse do general Garrastazu Médici, que inauguraria o período mais duro do arbítrio militar no governo. Só para lembrar que se deve dar importância relativa a discursos de posse.

No seu, Dilma disse o previsível, mas disse bem. E tocou de forma sucinta mas emocionada no detalhe mais importante do momento, o contraste entre o seu passado na clandestinidade e na prisão, no tempo da luta contra o arbítrio, e a sua investidura como presidente do Brasil. Ela poderia muito bem ter terminado o discurso abrindo os braços e dizendo “Olha eu aqui: dá pra acreditar?”.

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