Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 7 de junho de 2008
08 de junho de 2008
N° 15626 - Luis Fernando Verissimo
Frutijas ausentes
Cenira não ficava gripada, apenas. Ficava escandalosamente gripada. Suas gripes tinham esguichos e erupções. Espirros em série, tosse de sacudir a cristaleira. Parecia que ia morrer. E ela confirmava:
- Eu vou borrer. Eu vou borrer!
E, depois de outra rajada de espirros, que borrifava o que tivesse em volta:
- E vou levar gente cobigo!
"Anfitrião", não sei se você sabe, vem de Amphitryon, da mitologia grega. Amphitryon casou-se com Alcmena, mas antes que o casamento fosse consumado, Zeus, que podia tudo, disfarçou-se de Amphitryon e papou a Alcmena primeiro. Dessa união nasceu Heracles, que o bom Amphitryon criou como um filho, mesmo desconfiando dos atributos semidivinos que o garoto demonstrava desde o berço.
Amphitryon ficaria na história como um corno exemplar se o mito não tivesse sido adaptado para o teatro por Molière, no século 18. Um dia o Amphitryon de Molière chega em casa e encontra outro deus, Júpiter, também disfarçado de Amphitryon, na cama com Alcmena.
Grande bafafá, é ou não é, e reúnem-se os nobres para decidir qual dos dois é o verdadeiro marido de Alcmena. Júpiter convida todos os presentes para jantar, enquanto não chegam a uma conclusão.
Um empregado de Amphitryon, Sósia (que na verdade é outro deus, Mercúrio, disfarçado) declara que isso acaba com qualquer dúvida, pois o verdadeiro Amphitryon é o Amphitryon que dá jantares.
E desde então "anfitrião" ficou sendo o nome de quem recebe em sua casa. Mas cuidado. Ao ouvir alguém ser chamado de "conhecido anfitrião", procure saber se é no sentido pré ou pós Molière.
Falavam-se maravilhas daquele novo chef espanhol. Que sua comida chegara a fronteiras nunca antes imaginadas de requinte e originalidade. Tanto que um grupo de ricos reuniu-se para trazer o chef ao Brasil e o recebeu com apenas um pedido:
- Assombre-nos.
O chef fez algumas exigências. Pagamento adiantado. Dólares? Jamás. Euros.
Também precisava saber para quem iria cozinhar. Eram pessoas sofisticadas?
Díssimas, responderam. Conheciam sua reputação? Sabiam da sua cozinha diáfana? Sim, sim, responderam, e queremos prová-la. Estamos pagando uma fortuna para poder dizer que a provamos a quem nunca a provará. Bien, disse o chef.
Trabalharia sozinho. Suas receitas eram secretas. Ninguém poderia vê-lo trabalhando. No seu restaurante, na Espanha, seus ajudantes assinavam um termo de confidência que, se rompido, significava a morte por garrote vil.
E uma última exigência: a música de fundo na cozinha. - Mozart.
Segundo o chef, Mozart estabilizava os molhos.
No local escolhido para o jantar, não mais do que 12 pessoas. Grande expectativa.
O próprio chef traz os pratos do que chama de Menu Evanescente, que começa com uma roda de pequenas colheres vazias num prato vazio, que ele descreve como "Evaporaciones mediterraneas" e prossegue com uma seqüência de pratos vazios, todos elaboradamente descritos pelo chef ("sueño de conejo con evocación de almejas", etc.), até o último, que vem com uma espuminha na borda que ele avisa para não comerem porque é enfeite.
Depois de se entreolharem, na chegada do primeiro prato vazio, sem saber o que fazer, as pessoas pegam os talheres e começam a "comer" com mímica, algumas fazendo "mmm" a cada garfada. No final, depois da sobremesa - desta vez uma tigela vazia, "crema hipotética de frutijas ausentes" segundo ele - o chef é aplaudido.
- Maravilha! Maravilha!
E todos saem do jantar com fome mas certos de que terão o que contar para serem invejados.
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