sábado, 7 de junho de 2008



07 de junho de 2008
N° 15625 Moacyr Scliar


O primeiro cigarro, o organismo não esquece jamais

Dizem que o primeiro sutiã a gente não esquece, o que, ao menos no caso do sexo masculino deve ser verdade, e ainda que, nos revoltados anos 60 as mulheres queimassem essa peça do vestuário em sinal de protesto.

O organismo também não esquece o primeiro cigarro, infelizmente. É o que mostra um estudo realizado com 5,8 mil estudantes de escolas londrinas. Estes jovens foram acompanhados dos 11 aos 16 anos.

Os estudantes que tinham fumado aos 11 anos, mesmo que apenas um cigarro, tinham duas vezes mais chance de, aos 14 anos, se transformarem em fumantes. Um prolongado período de latência, mas a vontade de fumar acabou prevalecendo.

Por que? Os pesquisadores levantaram várias hipóteses: o primeiro cigarro pode induzir modificações químicas que progridem para a dependência.

Ou então podem representar o ato de "virar a mesa", de derrubar os obstáculos ao tabagismo. Ou pode ainda reforçar os traços de personalidade que levam a pessoa a fumar. Segundo outro estudo, este realizado em Massachusetts, adolescentes que se sentem "relaxados" quando fumam o primeiro cigarro tendem a se tornar fumantes.

Essa sensação de "relaxamento" resulta do efeito da nicotina sobre o cérebro. Aliás, outras manifestações de sensibilidade à nicotina, como náusea e tontura, também antecipam dependência. É como se o organismo estivesse avisando a pessoa: cuidado, estou no caminho do tabagismo.

A verdade é que há muitas razões, lógicas ou não, para fumar. Encontrei na internet um artigo escrito em 1947 (antes, portanto, de que o tabagismo fosse correlacionado com numerosas doenças), de Ernest Dichter, um famoso psicólogo que surpreendentemente se dedicou ao marketing - foi ele quem criou o slogan da Exxon "Ponha um tigre no seu carro".

Dichter era um fã do cigarro: fumar é divertido, diz ele, fumar funciona como uma recompensa, fumar dá prazer, fumar satisfaz a oralidade, fumar ajuda a pessoa a ser mais social, fumar é relaxante, fumar ajuda a refletir, fumar faz parte da cultura de nosso tempo, fumar tem até um conteúdo simbólico, na medida em que a brasa do cigarro evoca o fogo em torno do qual se reuniam nossos antepassados.

Estava mentindo, Ernest Dichter? Não, não estava mentindo. Fumar é uma questão de custo/benefício. Os benefícios existem, mas os custos podem ser altos. Os portadores de câncer de pulmão que o digam.

Daí a contundência das novas peças publicitárias do Ministério da Saúde alertando os jovens para os problemas do tabagismo. O Dichter talvez não gostasse delas, mas é preciso salvar vidas, e quanto mais cedo melhor. A recusa ao primeiro cigarro ajuda muito a saúde das pessoas.

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