Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sexta-feira, 7 de março de 2008
ORIGENS DA GUERRA
Não me canso de citar Borges. Alguns leitores não cessam de repetir que eu sou repetitivo. O problema é que duelos, punhais e paradoxos se repetem nos escritores. Há quem jure que todos os escritores são apenas um multiplicado por um espelho. Os ruins seriam rachaduras ou distorções de ótica.
A história que vou contar hoje envolve os dois Borges de que falo, o de Palomas e o escritor argentino. O autor de 'El Hacedor', de resto, registra num poema que 'nada ou muito pouco' sabe sobre os seus antepassados portugueses, os Borges.
É possível, portanto, que um deles tenha vivido em Palomas, onde o bisavô teria chegado em 1877, depois de se ter visto num espelho como um homem sem olhos que enxergava um futuro de guerras e de superpopulação. O cego Borges, palomense soturno, de fato existiu, mesmo se alguns garantem que Borges era o seu apelido.
Ou pseudônimo. O argentino Borges, em 'Pierre Menard, Autor de Quixote', narra a surpreendente aventura de um homem que resolveu escrever 'Dom Quixote'. Não se tratava, bem entendido, de reescrever a obra de Cervantes, mas de escrevê-la.
O Borges palomense, segundo os que o conheceram bem, dedicou a vida a escrever as obras do outro Borges. Parece que alcançou um tal êxito, que chegou a antecipar alguns textos que mais tarde o argentino Borges escreveria com sucesso e elegância.
Jorge Luis Borges, em 'Tlön, Uqbar, Orbis Tertius', faz seu amigo Bioy Casares citar um homem de Uqbar para quem o sexo e os espelhos são abomináveis por multiplicarem o número de homens. Essa relação, além de lógica, é instigante e assustadora.
O palomense Borges gostava de contar a história de um caudilho que, por volta de 1890, fizera a mesma descoberta jogando brasas numa cambona com água para o mate. Homem de ação, resolvera cortar o mal pela raiz. Mandara proibir o sexo.
Diante da impossibilidade de fazer cumprir uma ordem tão simples e civilizadora, adotara medida ainda mais radical e bem-intencionada: castrar os homens em idade de procriação ou de gosto pela fornicação. Foi nessa época que se tornou conhecido um punhal de prata com qual o Dom Benito teria capado mais de cem homens numa mesma tarde.
A idéia, apesar de profilática, não prosperou. Dom Benito não queria um povo de eunucos. A palavra não lhe soava bem. Sem contar que deixava os homens com voz fina e jeito de gato no oitão. Além disso, quanto mais ele castrava os machos, mais filhotes apareciam.
Finalmente, ele teve a idéia de que precisava: lançou os homens à guerra. Acostumados a castrar e ser castrados, eles desenvolveram uma variante mais eficaz, a degola. Essa é a mais provável origem da Revolução Federalista de 1893.
Palomas conheceu o seu mais baixo índice de natalidade e o seu mais alto índice de solidão entre as mulheres. Quando, no entanto, a guerra acabou, dois anos mais tarde, alguns homens voltaram e a multiplicação recomeçou furiosamente.
Dom Benito desenterrou o punhal e retomou a sua luta contra a maldição dos nascimentos sem fim, degolando em vez de castrar para evitar reclamações e não estimular o gosto pela ópera. Tempo perdido.
Os palomenses proliferavam como escritores em busca de uma editora. Era uma praga. Então, depois de um longo recolhimento, Dom Benito compreendeu o que devia fazer: mandou destruir todos os espelhos do povoado. A população de Palomas nunca mais passou de 300 habitantes.
juremir@correiodopovo.com.br
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário