terça-feira, 11 de março de 2008



11 de março de 2008
N° 15537 - Cláudio Moreno


Uma jóia muito rara

Todos nós queremos ser felizes; Pascal já dizia, com certa ponta de humor, que esse é o motivo de todas as ações humanas, mesmo daqueles que estão pensando em se enforcar.

Os gregos também consideravam a felicidade o bem mais precioso, mas faziam uma distinção essencial: para os deuses, que viviam rindo e festejando, ela era eterna e inesgotável; para os mortais, no entanto, além de extremamente rara, era frágil e delicada como o cristal, sempre ameaçada pelo acaso e pelos reveses da fortuna.

O triste fim de Creso, rei da Lídia, dono de uma riqueza lendária, tornou-se o exemplo preferido de todo o mundo antigo. Quando Sólon, um dos sábios da Grécia, visitou sua corte, Creso lhe havia perguntado, orgulhoso, se conhecia alguém mais feliz do que ele.

Sólon poderia ter criticado a vaidade do rei, mas preferiu adverti-lo para a instabilidade da condição humana: "Só na hora da morte podemos dizer se alguém foi feliz ou não. Para chegar aos 70, um homem terá de viver 25 mil dias - e ninguém pode saber o que cada dia trará!".

Creso tinha ignorado essa resposta, considerando-a como uma simples impertinência do filósofo, mas só foi compreender seu significado quando, muitos anos depois, seu exército foi derrotado pelos persas comandados por Ciro.

Ferido, humilhado, o rei foi amarrado sobre uma pilha de lenha para ser queimado vivo; quando o fogo começava a crepitar junto a seus pés, olhou para o céu e bradou, arrependido: "Sólon! Oh, Sólon!".

Ciro, intrigado, mandou o intérprete perguntar quem era esse deus desconhecido; quando soube que era um dos Sete Sábios e se inteirou do que ele havia dito, suspendeu a execução, pois tinha visto a si mesmo na figura lastimável de Creso, um homem que tinha sido, um dia, tão poderoso quanto ele.

Além de precária, a felicidade pessoal era vista como um bem escasso, cujos quinhões eram distribuídos a uns e negados a outros ao capricho da sorte e do destino.

"O mundo não prometeu nada a ninguém", dizia um velho provérbio, resumindo essa idéia que, até o séc. 18, era compartilhada por todos, do monarca ao lavrador.

A Revolução Francesa, no entanto, mãe da sociedade democrática moderna, levou-nos a acreditar ingenuamente que todos podem ser felizes, desde que haja o esforço suficiente de nossa parte e de nossos governantes.

Amarga ilusão! Foi a partir dela que as utopias marxistas idealizaram uma felicidade coletiva proporcionada pelo Estado, sonho que acabou destruído por sua inevitável vocação totalitária.

Pior ainda: ela é o verdadeiro motor de nossa sociedade de consumo, que vende, muito mais que as mercadorias, a crença perversa de que qualquer pessoa pode comprar o necessário para ser feliz.

Nessa visão distorcida, o sofrimento passou a ser um escândalo, e a felicidade deixou de ser o sentimento efêmero e delicado que sempre foi para se tornar obrigatória.

Oh, Sólon! Quando poderias imaginar uma sociedade maluca como esta, em que a obsessão de ser feliz aumenta, a cada novo dia, a infelicidade das pessoas!

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