24 DE OUTUBRO DE 2020
LYA LUFT
Mudanças & escolhas
Mudanças: sempre desejei ficar quieta, ficar em casa, no quarto, lendo, ou no jardim olhando as nuvens, como tanto fazia em menina, talvez por isso hoje em dia pintando sobretudo nuvens... e mares.
Talvez mudanças me causem insegurança. Assim, sou bastante boa em manejar palavras, mas péssima em brigas e discussões: quero ficar embaixo da mesa, e chorar.
Nunca gostei de viajar, embora tenha feito incríveis viagens, e adore estar em lugares também incríveis. Me cansam aeroportos, esperas, essas coisas (além de algum medo de voar...) que não são importantes, importantes são os locais, as tradições, as pessoas, as comidas, as paisagens, tudo. Nunca esquecerei a lua cheia subindo diante da sacada de nosso apartamento em Atenas, vindo por trás do monte Lykavitos, como uma aparição. Então, há mudanças que eu amo.
Hoje, estarei de novo mudada, saindo do lado de um querido e admirado colega, Milman, para este lado de outro admirado e querido, o David Coimbra. Que meus leitores me encontrem, e se multipliquem neste recanto de tanta responsabilidade. Há quem leia o jornal de trás para a frente, me disseram. Então, acabarei lida.
Mas não é só disso que quero escrever hoje, quero falar das escolhas que podemos ou não fazer, para viver um pouco melhor nestes dias de escândalos ou loucuras, medo e esquisitices, além de quase vazio sobre o futuro.
Um filósofo me disse outro dia que "podemos escolher se queremos ou não perturbar o nosso espírito". Amei a frase. Como o meu espírito facilmente se descompõe e desatina, com as mais loucas fantasias ou as mais ingênuas deduções, essa frase me importou muito, e estou tentando, a cada dia, melhorar no seu exercício.
Alguém me criticou, caluniou, desprezou? (Nesta altura da vida, não tenho mais tanta importância para merecer esse tipo de tratamento.) Então posso decidir quanto vou me magoar, ou indignar, e quanto vou preservar minha relativa paz interior, que com o tempo cresce - um dos benefícios do passar do tempo.
Se notícias do país ou do mundo me chocam, me causam indignação ou até medo, também posso medir a quantidade de mal que vou permitir que isso me cause, isto é, falando horas a fio no assunto, remoendo até em silêncio, ou comentar brevemente e jogar na lata de lixo das coisas malignas que só servem para atormentar. Não me alienando, mas não deixando que rasguem as carnes da minha alma. Isso se aprende, a muito custo, mas é possível.
De modo que partilho com o leitor essa ideia, de escolhermos, dentro do possível, e na medida certa, o que pode ou não abrir feridas em nosso espírito. Claro que não falo de tragédias pessoais como o luto - que por vezes se estende uma vida inteira, apenas abrandando com o correr dos anos - nem de ficar calado diante de ofensas a outros ou a nós mesmos. Falo dessas dezenas de cobrinhas venenosas que querem eventualmente morder nossos calcanhares, querem nos abocanhar, mas... a gente não deixa.
Temos coisa melhor a fazer: viver.
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