sábado, 14 de novembro de 2020


14 DE NOVEMBRO DE 2020
MÔNICA SALGADO

A banalidade que habita em mim 

Saúde a banalidade que habita em você. E nesse clima eu acordo, às 7h10min, com o despertador gritando. Sim, durmo com o celular ligado, carregando. Com isso, infrinjo duas regras logo de cara: dormir com o celular ligado, supostamente emanando radiação prejudicial ao meu já prejudicado sono; dormir com o celular carregando, supostamente viciando a bateria que já alcançou 100%. Mas durmo com o celular ligado carregando mesmo assim.

Tomo metade do meu Ansitec e guardo a outra metade pra de noite. Dou uma checada rápida no WhatsApp. E levanto para acordar meu filho, que tem dormido no sofá ao pé da minha cama. Pois é, começou na pandemia. Deveria? Não deveria. Tá certo isso? Não, não tá. Porém ando tendo coisa mais importante pra resolver, outros focos pra aplicar minha ultimamente combalida energia, então fui deixando, deixando...

Ele enrola demais para acordar. A ponto de minhas investidas começarem fofas & açucaradas - "Meu amo-or! Bom dia, Bezinho" - e terminarem putas da vida - "Poxa, é todo dia esse drama pra levantar, tá sempre enrolando e atrasado. Olha que amanhã coloco o despertador pras 6h45min, hein?". E nunca coloco. Porque isso significaria eu ter que acordar a esta hora também.

Descemos pro café. Tapioca ou ovos mexidos? Muito café preto. Esse menino tem que parar de tomar achocolatado porque isso é puro açúcar. Cinco gotas de adoçante pra mim - aquele que dizem que dá câncer. Não consigo me acostumar com stevia (bicho amargo), muito menos com café puro. "Na primeira vez que você toma, é estranho. Depois acostuma", dizem to-dos a-que-les que tomam café puro. Não me convencem.

Saímos pra garagem. Volta, esquecemos a máscara! No carro do meu marido porque bati o meu há cerca de um mês e está no conserto. Novinho, nem placa tinha. Visto meu pijama e chinelos com meia. Nem preciso sair do carro, afinal. Ao chegar à escola... Tenho que descer do carro para abrir a porta pro meu filho, porque a bendita está com trava de criança.

Emendo com a academia do condomínio. Aquele bigodinho de suor me afogando atrás da máscara. A irritação com as pessoas que insistem em revezar três, quatro, cinco equipamentos, bloqueando todos a seu bel prazer. Em tempos de covid! Argh!

Volto pra casa. Minha cachorras voam pra cima de mim como se tivesse ficado uma semana fora. Me sinto importante. A pequenininha deixa escapar gotinhas de xixi de tanta excitação. Acho fofo, mas me irrita. Enxugo.

Tomo meu banho. Coloco minha """roupa de trabalho""" - assim mesmo, com três aspas. Moletom e camiseta. E as indefectíveis meias (não fico confortável sem). E dá-lhe Zoom, calls. Ou melhor, dá tempo de um Zoom só e olhe lá. E então já deu a hora de pegar o filho na escola.

Ele entra emburrado no carro. É o Lucca de novo. Chamou o Bê de bambi por ser são-paulino. Bocejos pra originalidade do Lucca. Chegamos direto pro almoço. "Mas por que não tem macarrão com salsicha?" Porque não dá pra fazer macarrão com salsicha todo santo dia. Ninguém vive saudável e bem alimentado comendo macarrão com salsicha todo dia.

Depois do almoço, é a hora dela, a tarefa de casa. Aquele momento em que você se pergunta o que o seu filho faz todos os dias na escola... Porque aprendendo aqueles conteúdos ele aparentemente não está. Você briga com ele, ele briga com você. Vocês parecem dois colegas da quarta série A.

Volto pro escritório. Tem coluna pra terminar, podcast pra gravar, planejamento de cliente para pensar, roteiro de live para escrever, conteúdo pras redes para criar com criatividade, dinamismo, originalidade... Essa vida de carreira solo às vezes cansa, viu? Saudade daquele salarinho pingando no fim do mês. Opa, já passou!

Abro um vinho? Não! Tô de promessa. Sem vinho minha mente não sossega. E pensa, pensa, pensa. Assisto um pouco de A Fazenda. Depois, O Vestido Ideal. Emendo com 90 Dias para Casar. Tomo mais meio Ansitec. Vai batendo o sono. Cubro meu filho com a manta de Homem-Aranha, no sofá aos pés da minha cama. Dou um selinho de boa noite no meu marido. Rezamos juntos um Pai Nosso. E descansamos de mais um dia - ou de menos um dia - cheio de banalidades. Destas que a gente chama de rotina e que, no fundo, nos dão a segurança e a previsibilidade de que tanto precisamos.

MÔNICA SALGADO

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