sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015


06 de fevereiro de 2015 | N° 18065
DAVID COIMBRA

Contra o impeachment

Nós não conhecíamos esta palavra, impeachment. Foi o Collor quem nos ensinou. Trata-se de palavra pedregosa para escrever, com suas tantas sílabas e, entre elas, três consoantes solertemente encadeadas, e ainda mais pedregosa para falar: “impítima”.

Bem. Collor foi “impichado”, e agora, 22 anos depois, fala-se em impeachment de Dilma. O atento jurista Ives Gandra inclusive deu um parecer afirmando que há precedentes legais para tanto. Não duvido. Querendo, juristas atentos encontram precedentes legais para quase tudo.

Querendo. Eis o problema: o querer.

Muita gente quer Dilma fora da Presidência. Compreensível – Dilma não faz um bom governo. Os programas sociais criados ou incrementados por Dilma e Lula são bons, mas o PT perdeu a chance de transformar as estruturas do país.

Uma tristeza, esse tempo que se foi. Em 2002, Lula era a esperança. Até Fernando Henrique foi acusado de dar-lhe apoio velado. De lá para meados de 2014, foram 12 anos praticamente sem oposição. Ou seja: com as mais propícias condições políticas que um presidente poderia esperar. Na economia, melhor ainda. A estabilidade do Plano Real foi saudavelmente mantida e o crescimento da China arrastou junto o do Brasil. Quadro igual, tão azul e cor-de-rosa, só se viu nos anos 70, com o Milagre Econômico.

Estava tudo pronto para a grande virada. Haveria pouca resistência às reformas de que o país precisava: a reforma tributária, a reforma do Código Penal, a reforma da Previdência, a reforma da educação básica e fundamental e até a menos importante e mais propagandeada, a reforma política.

Mas o PT não tinha estofo para essa tarefa. O PT tinha apenas um projeto de poder, não de país. O mensalão e o petrolão são frutos desse projeto de poder, que não é nada senão o velho clientelismo e o velho coronelismo, ambos tão conhecidos do povo brasileiro, mas desta vez rearranjados organicamente, com método e com o lustro da esquerda.

Tudo isso é ruim, mas não é motivo para destituir um presidente da República legitimamente eleito. Collor, quando caiu, não foi por causa do famoso Fiat Elba, como se apregoa, mas foi por causa do que provou o Fiat Elba: ali estava configurado o envolvimento pessoal de Collor com a corrupção de seus assessores.

A corrupção de setores de um governo ou a incompetência de todo o governo não pode abalizar a derrubada de um presidente. Se abalizasse, teríamos um novo presidente a cada semestre.

O impeachment de Dilma só poderia ser cogitado se houvesse prova concreta de sua participação na corrupção, o que duvido que haja. Ou de seu conhecimento da corrupção, o que provavelmente havia, mas que dificilmente pode-se provar.


É muito importante para o Brasil a justa punição de todos os culpados pela corrupção deste governo, desde que a punição seja precisamente isto: justa. Querer derrubar um presidente eleito sem todas as provas concretas para fazê-lo é repetir o erro do PT: é ter um projeto de poder, não de país.

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