ELEIÇÕES
2014 - VINICIUS TORRES FREIRE - COLUNISTA DA FOLHA
Pressão na economia
Reeleita,
Dilma tem o desafio de vencer descrédito de investidores para ampliar
investimento em meio a um cenário internacional ainda nebuloso
A
presidente reeleita, Dilma Rousseff, não deu indicação explícita de como vai
conduzir a economia. Por meio das críticas extremas que fez a seus adversários
durante a campanha, pareceu indicar de modo implícito que não pretende fazer
mudança alguma. Mas a pressão por novidades parte mesmo do entorno da
presidente.
A
pressão parte de Lula. De economistas próximos do petismo ou ex-integrantes de
governos petistas. A presidente terá dificuldade de nomear uma equipe econômica
com credibilidade e que aceite continuar o programa dilmiano nos mesmos termos
de 2011-2014. O que resultará da resistência de Dilma e dessas pressões é mistério
até para quem trabalhou na equipe econômica do primeiro mandato.
A
presidente muito se queixou dos efeitos da crise mundial sobre a economia em
seu governo. As melhorias previstas para os próximos anos não favorecerão o
Brasil no estado em que está. Sem mudanças domésticas, haverá o risco de correção
abrupta.
As
mudanças de curto prazo, aquelas necessárias só para estabilizar a economia em
crescimento de baixo a moderado, envolvem a contenção provisória da alta do
consumo. O instrumento será alguma combinação de redução de gasto público,
aumento de impostos e alta de juros.
O
peso do "ajuste" pode ser distribuído de modo socialmente mais ou
menos justo. Mas implica contenção do consumo, de salários. Não é preciso
talhar gastos de programas sociais. Mas, por um tempo, eles terão de crescer
mais devagar ou quase nada.
CRISE
MUNDIAL
A
economia global deve andar mais rápido nos próximos cinco anos. Ainda assim, há
risco de a transição para dias melhores ser acidentada. E o crescimento estará longe
do ritmo anterior à crise de 2008; o balanço dos motores da economia mundial
será diferente, pois os grandes "emergentes" crescerão mais devagar,
como a China.
O
andar da carruagem global não determina o ritmo do Brasil, embora o influencie.
A influência será tanto mais nociva quanto mais a economia permanecer "frágil".
Ainda que ventos não sejam muito contrários, sem mudança o país terá dificuldade
de sair da quase-estagnação.
A
fim de se fortalecer, o país terá de passar por uma transição, voluntária e
organizada, ou turbulenta imposta pelo "mercado". "Mercado"
significa apenas os credores do governo e do país.
O
crescimento menos rápido de "emergentes" tende a reduzir os preços de
nossas exportações (de ferro, comida etc.). Caso o crescimento americano se
firme e Europa e Japão não desandem, haverá mudança na política monetária
internacional. Ou seja, haverá menos capital barato sobrando no mundo.
A
baixa relativa do preço das mercadorias que vendemos e o crédito mais escasso
tendem a evidenciar mais um sintoma de nossos problemas: excesso de consumo.
O
Brasil consome mais que produz. Compra no exterior esses bens e serviços que
faltam. Isto é, tem deficit em conta-corrente. Para financiá-lo, precisa de
empréstimos e/ou investimentos do exterior, "em dólar". Dentro de
certos limites e se a economia cresce bem, o deficit é financiável de modo
tranquilo.
Em
meados de 2005, o Brasil tinha um raro superavit em conta-corrente, de 1,9% do
PIB. Em setembro passado, o deficit chegou a 3,7% do PIB. Uma brutal inversão
de 5,6% do PIB.
FRAGILIZAÇÃO
O país
ainda financia com certa tranquilidade o deficit, que, em outros tempos,
prenunciaria crise (seca de crédito, desvalorização da moeda, recessão, visita
ao FMI). Não foi assim agora porque a economia tem estado mais arrumada: dívida
pública ainda controlada, grandes reservas internacionais (dinheiro no caixa "em
dólar").
Mas
a economia se desarranjou aos poucos nos últimos cinco anos. Passou a crescer
quase nada (quem não cresce não tem como pagar dívidas).
O país
não cresce porque a produtividade não aumenta, porque há pouco investimento e
porque o país agrega agora menos gente a sua força de trabalho. O investimento
privado caiu; o governo gastou mais, mas não investiu mais em "obras".
O consumo cresceu ainda bem, embora em velocidade decrescente; a produção
estagnou.
Em
parte, o crescimento do consumo foi bancado por excesso de gasto do governo (mais
dívida, via gasto direto ou redução de impostos) e por meio de crédito
artificialmente barato dos grandes públicos. Tais excessos se evidenciam em
deficit externo e inflação persistente.
O
novo cenário mundial pode dificultar o financiamento do deficit externo. O
Brasil enfrentará tal situação com menos instrumentos de reação: se não pode
baixar juros (dada a inflação), o governo não tem como gastar mais. De resto, o
governo sofre de descrédito por maquiar os números das contas públicas, fazer
pouco-caso de reformas e intervir de modo contraproducente na economia.
Em
caso de descrédito agudo, o "ajuste" será imposto pela indisposição
dos credores de financiar tais desequilíbrios: a moeda vai se desvalorizar, a
inflação será mais pressionada, o juro subirá, os salários reais cairão. A
alternativa ao ajuste voluntário é permanecer na quase-estagnação (crescer até 2%
ao ano), à espera de uma arrumação de casa imposta de fora, caótica e perigosa.
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