quinta-feira, 23 de outubro de 2014


23 de outubro de 2014 | N° 17961
CAPA

Dias de fúria

COM RICARDO DARÍN no elenco, Relatos Selvagens renova a força criativa do cinema argentino com coletânea de histórias sobre pessoas em situações que provocam desejo de vingança

Damián Szifrón garante que o acaso está na gênese de Relatos Selvagens, filme argentino que estreia hoje no Brasil no embalo da aclamada recepção no Festival de Cannes e do imenso sucesso de público em seu país 3 milhões de espectadores, número raro para o circuito local. Representante da Argentina na disputa por uma indicação ao Oscar de filme estrangeiro, Relatos Selvagens reúne seis histórias curtas com pessoas vivendo situações-limite que deságuam em um irrefreável sentimento de desforra.

– Cheguei a esse filme de forma involuntária, enquanto exercitava argumentos para novas histórias – diz Szifrón, em entrevista a ZH. – Nunca pensei em fazer um longa no formato de antologia, mas percebi que as histórias que escrevi para me divertir, desconectadas, tinham essa ligação temática.

Se o imponderável acendeu a fagulha criativa do diretor, e o elenco formado por talentosos nomes do cinema argentino – entre eles, Ricardo Darín – é um forte atrativo, a exitosa realização de Relatos Selvagens decorre de um somatório de acertos. O mais notável é a unidade narrativa do diversificado conjunto, pouco comum em projetos nesse formato, fruto de roteiros lapidados que fazem cada história atingir a força máxima rumo ao clímax.

Nos seis segmentos, Relatos Selvagens apresenta uma diversidade de tipos, situações e gêneros: passageiros de avião descobrem ter ligação com um rapaz que prejudicaram no passado; garçonete reconhece que o cliente grosseiro é o homem que arruinou sua família; dono de carrão e motorista de uma lata velha discutem em estrada deserta; engenheiro especialista em implosões (Darín) acha injustas as multas que leva; milionário tenta colocar um falso culpado em cena de atropelamento; noiva descobre, na festa de casamento, que o noivo é um pilantra.

Trabalhar sobre a linha tênue que separa civilização e barbárie com pitadas de humor negro, flertando com o fantástico, o suspense, o road movie e o melodrama, fez Relatos Selvagens chamar a atenção de Pedro Almodóvar. O cineasta espanhol, junto com seu irmão Augustín, assegurou a produção do longa assim que leu o roteiro de Szifrón. Conhecido por filmes como O Fundo do Mar (2003) e Tempo de Valentes (2005), Szifrón se destaca na Argentina também com seriados de TV que circulam em toda a América Latina, como Os Simuladores (2008).

– Não há fórmula mágica para criar um sucesso de público e também de crítica – afirma o diretor. – O importante é trabalhar com liberdade antes de pensar na reação dos outros. É uma discussão velha falar se um veículo é superior a outro. A TV nos permite trabalhar histórias de maior duração, impossíveis de desenvolver no cinema.

marcelo.perrone@zehora.com.br


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