sábado, 25 de outubro de 2014


25 de outubro de 2014 | N° 17963
CLÁUDIA LAITANO

Bem na foto

Mesmo com o Brasil virado em parque temático dos Irmãos Rocha (todos os tripulantes batendo na cabeça uns dos outros com um tacape de madeira), muita gente encontrou tempo para debates mais amenos nesses dias que antecederam as eleições.

Para o bem ou para o mal, o assunto mais comentado da semana não foram os terninhos da Dilma nem as gravatas do Aécio, mas as surpreendentes transformações no rosto da atriz Renée Zellweger. Por coincidência, a inesgotável fonte de notícias bizarras que nos abastece diariamente de espanto, curiosidade e horror nos brindou nesta semana com outra personagem que chamou a atenção pela aparência: a tailandesa Apasra Hongsakula, Miss Universo 1965, que, aos 67 anos, parece não ter envelhecido mais do que 10 minutos desde o dia do concurso. Renée assusta porque mudou muito, Apasra porque não mudou quase nada.

Houve um tempo em que apenas as “manequins”, os fotógrafos profissionais e talvez a Hebe Camargo tinham consciência de que a naturalidade de um retrato não tem nada de natural. Hoje até as meninas de oito anos sabem como se postar diante de uma câmera com estudada naturalidade – e a espontaneidade de modelos e fotógrafos tornou-se tão vintage quanto uma rolleyflex. Isso porque, para quem vive intensamente sua identidade virtual, estar “bem na foto” já não é uma questão apenas de autoestima, mas também de prestígio social. Retratos são carteira de identidade, currículo, cartão de visita. Uma vez na rede, circulam pelo mundo sem que tenhamos total controle sobre quem os recebe, a impressão que causam e até quando (e de que forma) serão usados.

Sendo assim, as celebridades perderam a exclusividade como objeto de escrutínio público. Hoje todos temos a oportunidade de sermos julgados no tribunal da imagem como Renée Zellweger foi nesta semana – seja pela beleza, que impõe critérios cada vez mais rígidos e inalcançáveis em qualquer idade, seja pela forma como lidamos com a passagem do tempo.

Podemos forjar um determinado estilo de vida postando imagens de momentos festivos quando nossa rotina é um tédio absoluto ou cenas românticas quando na maior parte do tempo queremos mesmo é esgoelar o ser amado. Mas é quase impossível disfarçar as marcas do tempo sem correr o risco de mudarmos demais (como Renée) ou de menos (como Apasra).

Continuamos envelhecendo do mesmo jeito que nossos avós: inexoravelmente. Mas nos últimos tempos temos registrado e acompanhado esse processo com boletins fotográficos diários, como se fôssemos estrelas de cinema em turnê pela vida. Famosos ou não, o que todos gostaríamos é que nosso rosto refletisse aquele tipo de serenidade que parece tornar mais suave o percurso entre o que já fomos e o que ainda seremos. Ou seja: que vivêssemos um presente abençoado pela rara sensação de que não estamos lamentando o que já passou, nem ansiosos com o que ainda virá.


Que o tempo nos transforme, sim, mas não tão rápido que pareça nos pegar de surpresa – nem tão lentamente que pareça photoshop.

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