26
de outubro de 2014 | N° 17964
ANTONIO
PRATA
A oposição
fluorescente
Não vou votar no Aécio, hoje, mas enquanto estiver
acompanhando a apuração, no início da noite, um lado meu torcerá secretamente
para que ele ganhe. Esse meu lado (que não revelarei a ninguém, caro leitor, só
a você, confiante na sua discrição) teme menos os próximos quatro anos sob um
governo do PSDB do que os efeitos anabolizantes e lisérgicos que outro
quadriênio petista pode causar à direita mais raivosa deste Brasil varonil.
Quando
digo direita raivosa não estou me referindo a quem é a favor da independência
do Banco Central, de um Estado menor e um superávit maior. Estou falando dos
Bolsonaros e Felicianos, da turma que prega “direitos humanos para humanos
direitos”, que deseja “afogar esses nordestinos” e diz, em rede nacional, que
“órgão excretor não é órgão reprodutor”. (Aliás, quando ouvi aquele homúnculo
cometer essa afirmação, com a segurança que só a profunda ignorância traz, me
perguntei: será que ele faz xixi pelo sovaco? Ou ejacula pelo bigode? Mas não
divaguemos, voltemos ao assunto).
A
chegada do PT à presidência, 12 anos atrás, teve um pernicioso efeito
colateral: por ser um partido historicamente ligado às minorias, permitiu à
direita mais tacanha camuflar seu preconceito contra negros, mulheres, gays,
índios e pobres sob uma papagaiada libertária, de crítica ao poder.
A
partir de 2003, o cara vinha com uma piadinha jurássica do tipo “o melhor
movimento feminino sempre foi o movimentos dos quadris” e queria aparecer na
foto com um sorrisinho transgressor, tipo, “si hay gobierno, soy contra!”.
Fazia um número de stand-up racista e alegava estar combatendo a censura do
Estado e a opressão do politicamente correto. Falava “as zelite” e “meus
deretcho” fingindo zombar do Lula, quando estava é babando a ancestral
demofobia.
Tal
reação conservadora me parece desproporcional aos avanços dos últimos anos.
Afinal, apesar de alguma melhora, continuamos profundamente desiguais. Os
negros seguem pior do que os brancos, as mulheres ainda ganham menos do que os
homens, gays não podem se casar e, vira e mexe, são acariciados por
heterossexuais com socos, pontapés e lâmpadas fluorescentes.
A
direita raivosa, contudo, cada vez mais ensandecida, acredita que vivemos numa
mistura de Venezuela com Sodoma. Pior: os inegáveis casos de corrupção e outras
patacoadas do PT fazem com que o discurso retrógrado chegue àqueles que não
comungam de seus preconceitos, mas se indignam, com razão, com os erros do
governo. Se na passeata de apoio ao Aécio, na última quarta, em São Paulo, que
a revista Economist chamou de “Revolução do Cashmere”, a multidão gritava “Viva
a PM!”, o que gritará em 2018, caso a Dilma ganhe?
Com
o PSDB no poder, porém, os paranoicos delirantes não teriam como ver, em cada
esquina, a ameaça de uma revolução cubana comandada por
travestis-negras-maconheiras-aborteiras. Abaixariam seus dedinhos exaltados e,
cofiando os anacrônicos bigodes, teriam de assumir que seu ódio não é nada além
do velho racismo, machismo, homofobia e demofobia do nosso Brasil varonil.
Sem
alternância de poder não é só a situação que corre o risco de perder o pé da
realidade: a oposição também precisa, de tempos em tempos, cair do seu
troninho.
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