Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 5 de fevereiro de 2011
06 de fevereiro de 2011 | N° 16603
VERISSIMO
Bodoque
Nunca mais me esqueci da sensação de ter um bom bodoque feito por mim nas mãos. Quer saber de uma coisa? Nunca mais tive a mesma sensação de poder
Dois velhinhos.
– O que você está fazendo? – Tirando a camisa.
– Olha que a enfermeira não vai gostar...– Só quero ver se eu ainda sei fazer.
– O quê? – Isto. Pfaf. – Como se chamava isso, no seu tempo?
– Pum sovacal. – Eu chamava de trombone axilar.
– Trombone? Não tem nada a ver com trombone. Parece pum.
– Eu não podia dizer pum. – Por que não? Na sua família não davam pum?
– Davam, mas não se falava a respeito.
– Incrível. Uma infância sem pum. Aposto que também não botavam o dedo no nariz. Tiravam meleca com cotonete.
– Dedo no nariz podia, mas não na frente dos outros.
– Como sua mãe chamava tirar meleca do nariz? Limpar o salão?
– O assunto não era abordado na nossa casa.
– Bodoque. Você sabia fazer bodoque?
– Acho que...
– Bodoque. Funda. Atiradeira.
– Acho que não.
– Era preciso encontrar uma forquilha perfeita. Depois prendia-se uma ponta de uma tira de borracha numa das pontas da forquilha, enfiava-se uma plaquinha de couro na tira de borracha e prendia-se a outra ponta da tira na outra ponta da forquilha. E estava pronto o bodoque. Nunca mais me esqueci da sensação de ter um bom bodoque feito por mim nas mãos. Quer saber de uma coisa? Nunca mais tive a mesma sensação de poder. Eu já lhe contei que fui um executivo importante, não contei?
– Várias vezes.
– Já comandei 600 empregados. Já tive a vida de mais de mil pessoas na minhas mãos, ou na mão que assinava os cheques. Fui um dos pró-homens da República. Aconselhei presidentes. Podia derrubar presidentes, se quisesse. E, no entanto, nunca tive um sensação de poder parecida com a de segurar uma forquilha, estender a tira de borracha com uma pedra colocada na plaquinha de couro, soltar a plaquinha e derrubar, não um presidente, mas um passarinho.
– Você matou muito passarinho?
– Matei, mas isso não interessa. O importante é que eu daria tudo, tudo que eu fiz, tudo que eu ganhei na vida, para ter um bom bodoque de novo nas minhas mãos. Para ter o mesmo poder.
– Por que não procuramos uma forquilha perfeita?
– Como? – Esta tarde, quando nos levarem para passear no jardim.
– Não, não. Você acha que uma forquilha perfeita se encontra assim? Ainda mais de cadeira de rodas? Não, não. Esquece.
– Olha, a enfermeira está vindo. Melhor botar a camisa.
– Vamos recebê-la com um dueto de puns sovacais.
– Você acha? – Vamos, vamos. Tire a camisa!
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