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sábado, 5 de fevereiro de 2011
06 de fevereiro de 2011 | N° 16603
DAVID COIMBRA
A família que chora
Há uma foto tocante na edição desse mês da National Geographic. Está estampada entre as páginas 66 e 67, ilustrando uma alentada reportagem sobre a cultura de papoula no Afeganistão. É a partir da papoula, você sabe, que se produz o ópio e a heroína.
O Afeganistão é responsável por 90% do cultivo de papoula no mundo, o que acontece sobretudo por incentivo do Talibã, que lucra com o tráfico.
O flagrante a que me refiro é o de uma ação policial numa pequena plantação de papoula no nordeste do país. A dona do naco de terra é uma viúva que perdeu o marido na guerra que há três décadas atormenta os afegãos.
A plantação é a única forma que tem de se sustentar, e aos seus quatro filhos. Na cena cristalizada pela câmera, os policiais, dezenas deles, empunham varas de bambu para destruir o plantio.
A mãe, vestida de preto, a cabeça coberta por um lenço vermelho, chora escondendo o rosto com as mãos. A sua volta, encostados em um barranco, os quatro filhos também derramam-se em prantos. Todos, mãe e filhos, estão acocorados no estilo oriental. A maiorzinha, com uns seis anos de idade, traja um vestido azul-escuro, retorce as mãos e fita a mãe com o desespero a lhe saltar dos olhos.
O que mais me chamou a atenção foi a atitude dos policiais. Eles continuam com as varas nas mãos, mas interromperam o trabalho para observar a família que chora. Olham, olham, e vê-se o que sentem: pena.
O repórter conta o que se seguiu a esse momento: o chefe do grupo, comovido, aproximou-se da menina mais velha, murmurou algumas palavras de consolo em seu ouvido e pôs-lhe nas mãos um maço de dólares afegãos. Ao que a mãe gritou:
– Devolva já esse dinheiro!
A foto fala de muitas coisas. De pobreza e orgulho; do que é legal, porém injusto; de exploração internacional e obscurantismo religioso. Mas a atitude dos policiais, o que ela expressa é o mais humano dos sentimentos: a compaixão. Bichos não sentem compaixão. Nem o cão mais fiel e inteligente é capaz de sentir remorsos. Os homens, enquanto são homens, sim.
O ser humano é um animal que se move por valores impalpáveis, sua vida se justifica por essas abstrações. O comum das pessoas reconhece e dá importância a isso, mesmo que sua própria vida seja conduzida exclusivamente por casa, comida e sexo, como todos os animais.
O futebol, a essência do futebol é justamente esse valor intangível. Porque o sentido do futebol é só um: o amor do torcedor pelo seu clube. Sem o amor incondicional, puro, ingênuo, idealizador e tolo do torcedor, o futebol não existiria.
Tolo. Mais do que tudo, o torcedor é um tolo, como todos os apaixonados. Fica embevecido com quaisquer demonstrações de afeto do objeto amado. Rochemback contou, agora que joga no Grêmio, que sempre foi gremista, mesmo quando jogava no Inter. O mesmo fez Tinga, mas ao contrário: confessou-se colorado inclusive quando defendia o Grêmio.
Ambos foram sinceros, percebe-se. Ganharam, com razão, os corações de seus torcedores. Porque se irmanaram a eles. Rochemback e Tinga são jogadores, fazem o que fazem por dinheiro. Mas também são apaixonados, também fazem o que fazem por amor.
Isso, essa singela declaração de um jogador que se diz torcedor, é isso que torna sublime o futebol. Porque coloca um ingrediente a mais naquela atividade que parece puramente econômica.
Ronaldinho, em sua estreia no Flamengo, valeu-se desse sentimento. Beijou a camisa, bateu no lado esquerdo do peito e jurou ser flamenguista porque “todos somos um pouco Flamengo”.
Somos?
Tenho dúvidas. Conheço uns e outros que não são nem um pouco Flamengo. Mesmo assim, há que se dar um crédito ao Ronaldinho. Ele parecia um flamenguista honesto naquela noite. Mas, nesse caso, no caso de ele realmente ser flamenguista, o Flamengo deve tomar suas precauções. Porque, lembrem-se os flamenguistas: Ronaldinho é um pouco Flamengo, mas é muito, e sempre perigosamente, Grêmio.
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