domingo, 3 de agosto de 2008



03 de agosto de 2008
N° 15682 - MOACYR SCLIAR


Fazendo o próprio caminho

Era, confesso, uma falha no meu currículo, mas eu não sabia muito sobre a Clarah Averbuck. Acompanho à distância o trabalho dela, fiquei entusiasmado com a repercussão de Nome Próprio, o filme que, baseado na obra dela, foi dirigido pelo talentoso Murilo Salles com a atriz Leandra Leal.

E, ah sim, sei que é filha do grande Hique Gomez, um dos maiores talentos musicais surgidos no Brasil (segundo informações, o H de Clarah resultou de uma brincadeira de escola. Pode ser, mas acho que é uma homenagem, mais que merecida, ao Hique).

E descobri que a Clarah nasceu em 1979, o mesmo ano do Beto Scliar. Uma coincidência simbólica, porque o Beto também está iniciando sua carreira, só que na fotografia.

Começo de carreira: algo absolutamente inesquecível. É uma fase difícil e vital, uma fase de altos e baixos, uma fase em que a esperança alterna-se com o desespero, às vezes em questão de minutos. Isto é válido principalmente na carreira artística, que é sempre uma escolha ousada, heterodoxa, para dizer o mínimo.

Freqüentemente significa abandonar os estudos, coisa que a Clarah naturalmente fez. E freqüentemente significa buscar caminhos onde, aparentemente, não há caminho algum.

Sim, eu sei que “Caminante no hay camino, se hace camino al andar”, como diz o poeta espanhol Antonio Machado, mas não sei se alguma vez ele andou no matagal da incerteza literária. Não é fácil, Antonio Machado.

Posso falar por experiência própria. Há uma fase na vida em que a parte mais importante da anatomia do aspirante a escritor é o sovaco: ele coloca os originais embaixo do braço e vai em busca de editores, de gurus, de almas caridosas.

Fiz isso, enchi o saco de muita gente, inclusive do pobre Erico Verissimo, a quem levei um conto. Recebeu-me com aquela amabilidade que era sua marca registrada, pediu-me que voltasse dali uns dias. Quando o fiz, elogiou-me muito, disse que eu tinha um belo futuro, que deveria continuar. Saí de lá como se tivesse ganho o Nobel.

E aí, uns dias depois, descobri lá em casa a última folha do conto, que, de nervoso, eu tinha esquecido. Erico não deve ter entendido nada. Mas, grande ser humano que era, optou por encorajar o jovem aprendiz. Pelo que sempre lhe serei grato.

Clarah, que a rigor já passou da fase de principiante (já tem vários livros publicados, Vida de Gato, Das Coisas Esquecidas Atrás da Estante, Máquina de Pinball) e por editoras importantes começa sua carreira num mundo diferente daquele que minha geração encontrou. Para começar, literatura para nós era sinônimo de ativismo político; tratava-se de fazer a revolução através das letras.

Mas praticamente falávamos em circuito fechado, pois não tínhamos como mostrar nossos textos. A geração de Clarah também é contestadora, mas no sentido cultural, não político; preferem o rock ao hino da Internacional, preferem Bukowski a Marx.

E, muito importante, é uma geração ligada, eletronicamente ligada, que desenvolveu uma nova forma literária, o blog. Comunicação sintética, instantânea, ousada, que atinge o vasto público da Internet.

Ou seja, o mundo se renova, a literatura também. Clarah Averbuck, ícone da nova ficção, é um exemplo disso. Ela está fazendo seu caminho, de forma talentosa e intrépida. De um passado muito remoto, o jovem Moacyr, textos no sovaco, abana para ela, esperançoso.

Falando em gente de talento, registro as mensagens recebidas de Bernenice Busson (de Nova York – ZH chega longe), Neide La Salvia, Celia Maria Maciel, Alexandre Guedes, Henrique A.Ledur, Silvana Schwab, Silvia Saucedo, Magda Pilla. Abordam vários assuntos, sempre com inteligência e sensibilidade. Obrigado, leitores e leitoras.

Nenhum comentário: