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quarta-feira, 11 de junho de 2008
11 de junho de 2008
N° 15629 - David Coimbra
Como é duro ser o mestre
Fui professor, uma vez. Faz tempo, foi na Unisul, de Santa Catarina. Convidaram-me para dar aula duas vezes por semana e pensei que ia ser legal isso de ser professor. As alunas me olhando com reverência. Chamando-me de mestre. Admirando minha superioridade. Miando:
- Ai, como o senhor sabe tuuudo, profe. Ah, cara, realmente ia ser legal.
Já no primeiro dia, encontrei certa resistência dos outros professores.
- Tens algum curso de pedagogia? - perguntavam-me. - Que método vais empregar nas aulas? Essas coisas.
Invejosos, concluí. Corporativistas. Não querem que outros sejam chamados de mestres e sejam amados pelas alunas suspirantes.
Não me deixei intimidar, fui em frente na minha disposição de ser professor. Enfrentei algumas dificuldades que suponho serem normais para quem é noviço em uma atividade.
O velho e bom Ancheta passou por algo parecido. Pegou um time de adolescentes no Passo Fundo e acabou desempregado em um mês, vítima da impaciência dos dirigentes. O Jones Lopes da Silva escreveu uma matéria emocionante a respeito. Dias atrás, o Ancheta veio visitá-lo na Redação, abraçou-o e confirmou:
- Ainda não desisti. Quero trabalhar como técnico.
Eu também não desisti de ser professor, nas primeiras semanas. Segui com as aulas e as provas e tudo mais.
Até que surgiu aquele cara. Na verdade, ele não surgiu; já estava lá. Um dos alunos. Sentava-se numa das filas laterais da sala e parecia sempre meio aéreo. Olhava-me com uma expressão vazia e nunca falava nada. Não era alto. Nem baixo. Nem gordo. Nem magro. Moreno, cabelos castanhos, a mandíbula pronunciada como se carregasse um cinzeiro na boca. O tal prógnato. Enxergava o mundo com uns olhinhos de porco, pequenos, estreitos e baços.
Enfim, tinha a maior cara de burro.
Jamais dei muita atenção a ele, até certa noite. Triste noite. Havia pedido que a turma fizesse um exercício de texto bem básico e, depois de explicar tudo direitinho, perguntei a ele:
- Entendeu?
Foi meu grande erro.
Ele me olhou inexpressivamente e respondeu: - An? - Entendeu? - repeti. Ele:
- Ah. Entendi. - Então faz aí como eu disse. Ele fez. Errado. - Tu não disseste que havia entendido? - perguntei. - Vou explicar de novo. Foi o que fiz.
- Agora entendeu? Ele: - Entendi. - Então faz. Ele fez. Errado.
- Mas tu não disseste que tinha entendido??? Ele me lançou um olhar sem vida.
- Vou explicar outra vez! E o fiz. Bem devagarinho. Passo a passo. Passo a passo. Com exemplos e tal.
- E agora? Entendeu? - Entendi. - Entendeu mesmo?
- Entendi. - Não quer que explique de novo? - Não.
- Tem certeza? - Tenho. - Hm... Então faz aí. Ele fez. Errado.
Naquele momento, me deu uma vontade de chorar, mas uma vontade, uma vontade... Respirei fundo. Sentei-me ao lado dele para ficarmos do mesmo nível - dizem que isso funciona. Falei devagar, escandindo as sílabas:
- Vou... explicar... de... novo. Certo?
- Certo.
Retomei a explicação, mas já sentindo um aperto no peito, já sentindo que algo grave poderia ocorrer. Como ocorreu. Perguntei se ele havia entendido. Ele: - Entendi. - Jura por Deus?
- Juro.Suspirei. E, num fio de voz, com os olhos marejados, pedi:
- Então faz...Ele fez. Errado.
Compreendi que eu não era professor. A vida é assim. Alguns até sabem fazer, mas não sabem ensinar. Talvez eu precisasse daqueles cursos de pedagogia. Talvez os professores veteranos estivessem certos, afinal.
Espero que o Ancheta não encontre um tipo como aquele aluno no começo dessa nova carreira dele.
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