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sábado, 1 de março de 2008
02 de março de 2008
N° 15527 - David Coimbra
Como se faz um goleiro
O gordinho sempre vai para o gol, essa a regra da pelada. No Colégio Amstad, nos altos do IAPI, o gordinho do gol era o Lontra. O Lontra não gostava de pegar no gol, mas, se não fosse, a turma cobria-o de cascudo. Então, lá ia o Lontra para o gol. Contrafeito, mas ia. Tudo para não levar cascudo.
Claro que, no final do jogo, como ele sempre vazava, a turma cobria-o de cascudo.
Falo nos gordinhos forçados a pegar no gol porque vou publicar uma série de colunas sobre as posições no futebol e, para começar, nada melhor do que o começo: o goleiro.
Talvez por essa origem algo patética, de jogar obrigado numa posição, o goleiro é, invariavelmente, um trágico. Mais: o bom goleiro precisa ter algo de trágico. De dramático. Até porque o goleiro é a segunda posição mais importante no futebol.
A primeira é o centroavante, lógico. Grandes times não podem prescindir de um ótimo goleiro e um ótimo centroavante. O último grande time do Grêmio tinha Danrlei e Jardel. No Inter: Manga e Dario, nossa!
É desse goleiro que queria falar: Manga. O melhor que já vi dentro de uma área grande. Manga tinha uma compreensão estreita da vida. Não sabia nem em que ano havia nascido. Sua idade era um mistério.
Uns diziam que contava 37 anos quando chegou ao Inter, em 1974; outros que estava com 42. Seja. O fato é que era entrado em anos. A cara acidentada de crateras de bexiga ajudava a torná-lo ainda mais enigmático. Manga era feio de assustar criancinha.
Mas de jogar de goleiro sabia tudo. Nunca usou luvas. Jogou num tempo em que o atacante tentava empurrar o goleiro com bola e tudo para dentro do gol. Assim, seus dez dedos restaram quebrados, tortos, garras de bicho que catavam a bola e não largavam mais.
Manga jogou a Copa de 66 e foi considerado um dos culpados pelo fracasso da Seleção. Num dos jogos, ele foi sair jogando, chutou na nuca do adversário, que retornava para o meio do campo, e a bola entrou.
No Botafogo, João Saldanha acusou-o de ter se vendido, saiu correndo atrás dele de revólver em punho. Manga pulou o muro do clube, fugiu e nunca mais voltou.
Foi para o Uruguai e transformou-se um dos maiores ídolos da história do Nacional, o que não é pouca coisa. Depois, já tendo voltado ao Brasil, ia ao Uruguai para jogar nos cassinos, era viciado em jogo.
Quando entrava em algum restaurante, todos se levantavam para aplaudi-lo, até os torcedores do Peñarol, o que também não é pouca coisa.
Por causa dessa temporada uruguaia, Manga esqueceu-se do português. Falava um portunhol manco que não era uma língua nem outra. Ficou complicado compreendê-lo.
Quando Ballvé contratou-o para o Inter, o técnico Minelli estranhou:
- Mas ele joga ainda?
Jogava. E como! O Atlético Paranaense estava sendo festejado, indagorinha, por ter vencido 12 partidas em seqüência. Em 1974, o Inter conquistou o Gauchão vencendo TODOS os 18 jogos do campeonato. Manga levou só dois gols. Como quisesse mostrar sua agilidade, impacientava-se com os atacantes do Interior. Um pegava na bola, ele gritava de debaixo das traves:
- Chuta! Chuta!
Esse negócio de Rogerio Ceni fazer gol, quem começou foi Manga. Num Gauchão, ele saiu da área para bater um pênalti contra o Gaúcho de Passo Fundo. Para quê! Foi a maior revolta, os jogadores do Gaúcho disseram que era uma falta de respeito, o goleiro adversário saiu de sob as traves para não engolir gol de outro goleiro. Um escândalo.
Manga era dono de um chute poderoso. Quando dava balão, mandava a bola para a outra área. Se fizesse a devolução com as mãos, atirava-a na intermediária de ataque. Um monstro.
Vi Manga fazer defesas inverossímeis. Num Gre-Nal, Neca chutou da pequena área, Manga caía para a direita, a bola ia entrar na esquerda. Pois, em meio à queda, ele fez o impossível: impulsionou o corpo para o outro lado, voou na horizontal e espalmou a bola para escanteio.
Manga tinha de sobra o que é necessário a todo bom goleiro: coragem aliada à calma, arrojo com serenidade, cautela e loucura. Por que era assim?
Porque devia ter sofrido quando pequeno. Devia ter sido um gordinho. Só com muito cascudo na infância é que se faz um Manga.
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