sexta-feira, 9 de janeiro de 2015


09 de janeiro de 2015 | N° 18037 
DAVID COIMBRA

O petista em quem sempre votei

“Nós não somos ladrões!”, bradava o ex-secretário-geral da Presidência da República Gilberto Carvalho. “Não somos ladrões!”, repetia com ênfase em seu discurso de despedida do cargo, dias atrás.

Fiquei com a frase ribombando nos vazios do meu cérebro, que são muitos. Carvalho referia-se aos governistas, em especial aos petistas.

“Nós não somos ladrões.”

Imagine você ter de dizer isso da sua família:

– Minha mãe não é ladra!

– Meu pai não é ladrão!

Imagine você dizendo dos seus filhos, da sua mulher, de você mesmo:

– Nós não somos ladrões!

Não, você não precisa dizer isso, claro que não. Gilberto Carvalho, um dos petistas mais petistas da história do petismo, precisa.

O PT, depois de 12 anos no poder, se transformou num partido de ética esgarçada, um partido oportunista, que, se não é formado por ladrões, no mínimo não vê os ladrões que o cercam, ou não os quer ver.

Não é uma derrota do petismo. É uma fragorosa derrota da política brasileira. Mais: é uma derrota da sociedade brasileira. Os petistas sempre foram maniqueístas e excludentes, mas esses são defeitos de quase todos os movimentos de esquerda. Em geral, os esquerdistas levam suas certezas para um púlpito acima dos outros seres humanos a fim de julgá-los.

Mas tudo isso era suportável, porque o PT prometia mudar a política brasileira. Não com grandes projetos para o país, o PT nunca teve grandes projetos para o país. Com honestidade. É isso: o PT mudaria o Brasil agindo com honestidade.

Fui eleitor do PT. Vou citar um petista no qual sempre votei, e cito-o porque ele se afastou da atuação pública: Flávio Koutzii. Homens como Koutzii, para mim, eram a esperança do país.

Koutzii não me decepcionou. O PT, sim.

O PT se transformou num PFL da esquerda. Quase posso ver antigos pefelistas proclamando:

– Nós não somos ladrões! Nós não somos ladrões!

Mas os destinos do PT e do PFL não me fazem desistir. Acredito que a política possa ser exercida com retidão. Há muitos homens públicos retos neste país, inclusive dentro do PT. Homens como Flávio Koutzii e outros tantos, que sairão fortalecidos com o que está acontecendo hoje no Brasil.

E isso é que é importante. A sociedade brasileira mudou e continua mudando. A indignação com os corruptos está se solidificando, os brasileiros não aceitarão mais o relativismo moral que vigia na vida pública. O acordo por conveniência, a vista grossa, o rouba mas faz estão deixando de ser palatáveis ao brasileiro.

Sim, as coisas estão mudando. Talvez até o PT mude, talvez se torne menos sectário quando na oposição e menos permissivo quando na situação. Talvez. O certo é que esses homens retos de que falo se encarregarão de, enfim, transformar a política brasileira. Que pode ser uma política compreensiva com as circunstâncias humanas, claro que pode e até deve, desde que não seja cínica, desde que seja clara inclusive nas suas eventuais concessões à dureza da realidade. Para que os governantes não tenham mais de vir a público, jurando:

– Nós não somos ladrões.

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