MARCOS
TROYJO
Iludindo-se com Cuba
O
argumento de que Cuba é economicamente um 'must' não pode ser levado a sério; o
potencial é irrisório
Nos últimos
12 anos, o Brasil apostou numa América Latina de "duas velocidades". Colocou
fichas na coalizão de regimes mais à esquerda. Privilegiamos o eixo "socialista-bolivariano",
baseado na onipresença do Estado na vida econômica e numa xenofobia seletiva
centrada nos EUA. Venezuela, Bolívia, Equador e de alguma forma a Argentina
integram esse grupo.
Com
a normalização de relações com seu grande vizinho, Cuba, epicentro histórico de
tal agrupamento, voltará a ter em Washington, não Brasília ou Caracas, sua
referência geoeconômica.
Da
perspectiva diplomática, iniciativas apoiadas pelo Brasil na cooperação hemisférica
sem a participação dos EUA, como Unasul e a Celac, perdem força.
Há outra
América Latina em movimento. A Aliança do Pacífico (México, Chile, Colômbia e
Peru) não é um bloco em si, mas plataforma para interação com outras áreas, até
o Mercosul. Negociam parcerias que envolvem também EUA, Japão e outros países
da Ásia-Pacífico.
Nessa
formação da América Latina de duas velocidades, o Brasil é uma espécie de
Hamlet --aprisionado no dilema do "ser ou não ser".
Do
lado do "ser", o empresariado industrial, historicamente refratário à
liberalização comercial, está mudando. A CNI já se disse aberta a acordos com
os EUA.
Do
outro, o "não ser", alguns acham que o Brasil deve evitar tratativas
hemisféricas em que os EUA estejam presentes. Partidários desse "não ser"
estão ávidos por demonstrar que nossa inserção internacional da última década não
é um retumbante fracasso.
Próceres
da política externa recente fazem ver que nos generosos gestos a Havana havia
embutida "visão estratégica". Com perspectivas que agora se abrem
para Cuba, o Brasil "sairia na frente".
A
economia não é --e tampouco deve ser-- único vetor da diplomacia. O tema da
solidariedade, por exemplo, é muito importante. No entanto, o argumento de que
Cuba é economicamente um "must" não pode ser levado a sério.
O
potencial de cooperação econômica com Cuba é irrisório. Seu PIB é de US$ 65
bilhões. O comércio Cuba-Brasil é de US$ 600 milhões. Apenas em 2013 os
brasileiros gastaram em Miami US$ 1,6 bilhão.
Cuba
não é a fonte de investimentos de que o Brasil tanto precisa. Não há parceria
de escala relevante para nossas dimensões.
O
porto de Mariel, suposto "golaço" de nossa política externa, não é um
investimento. Obras ali empreendidas por companhias brasileiras financiaram-se
pelo governo brasileiro. Trata-se de apoio à exportação de serviços. Não será o
Brasil ou qualquer empresa brasileira que operará Mariel, mas uma companhia de
Cingapura.
Não
há facilidade no futuro do porto apenas por que empresas brasileiras ajudaram a
construí-lo. O aeroporto de Miami também contou com participação de
construtoras brasileiras --nem por isso abrem-se oportunidades especiais para o
Brasil. Para a vertente latino-americana de nossa aposta terceiro-mundista, a
nova Cuba não é uma "bola dentro", mas uma "bola nas costas".
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