segunda-feira, 22 de dezembro de 2014


22 de dezembro de 2014 | N° 18021
MOISÉS MENDES

O que se passa com Fidel?

Ninguém mais conseguirá o que muitos tentaram: uma entrevista com Fidel Castro. Fidel não fala mais com a imprensa estrangeira.

Eu tentei. Em 2003, abordei Aleida Guevara no aeroporto Salgado Filho. A filha do Che vinha para o Fórum Social Mundial. Depois da entrevista, fui ficando ao seu lado, fomos caminhando em direção à saída, e então eu lhe disse: eu quero entrevistar Fidel Castro.

Aleida integra o Comitê de Defesa da Revolução, é poderosa na ilha. Me olhou como quem dissesse que todos queriam entrevistar Fidel, sorriu e falou:

– Sí, comprendo, es muy difícil. Pero...

– Pero?... – eu disse, assim mesmo, meio apalermado, com uma interrogação seguida de reticências, esperando que ela completasse a frase.

– Pero... – ela repetiu e foi cercada de gente. Só consegui entregar meu cartão a Aleida, e a filha de Guevara se foi, deixando aquele pero voando pelo aeroporto como um planador sem rumo.

Fiquei com aquele mas na cabeça. Mas o quê? Lembro que também conversei com um líder da Juventude Cubana, mas ele não me disse nada, nem um pero, um todavía ou um mientras tanto.

Voltei à Redação e contei que havia solicitado uma entrevista com Fidel. E que Aleida tinha respondido com um pero. Alguns riram de mim.

A fila de espera para entrevistar Fidel tinha mais de mil jornalistas. Marcelo Rech e Kadão Chaves, que estiveram em Cuba, fizeram parte dela.

Eu fiz o que se deve fazer. E se Aleida fosse o canal? E se Fidel decidisse: vou falar com esse cara que está lá no extremo de onde estamos.

Imaginei que poderia repetir o jornalista Joelmir Beting. Nos anos 1990, ele varou a noite conversando com Fidel. Depois, o comandante desistiu desse tipo de encontro, porque confundia sua cabeça.

Hoje, só o que interessa é o que se passa na racionalidade e na emoção mais profundas de Fidel depois do reatamento com os americanos. O que os outros pensam disso tudo pouco me importa.

Sabe-se que ele está lúcido e que as grandes decisões são suas. O que ele, Cuba e o socialismo ganham com isso? Como o modelo cubano irá sobreviver sem o duelo que o sustenta? E o desamparo da esquerda mundial? Como lidar com o aprofundamento do dilema igualdade-liberdade?

Tentativas de respostas permitem supor que, nas idas e vindas até o gesto da aproximação com Obama, muitas vezes Fidel deve ter dito a Raúl Castro:


– Perfecto, hermanito, pero...

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